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António Costa e o “grupo dos 10%” – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Out 7, 2023

Não há nenhum bom político que não tenha um bom inimigo. Quando um dia corre mal, quando uma medida corre muito mal ou quando uma entrevista corre terrivelmente mal, convém ter alguém que se possa culpar de forma imediata, eficaz e indolor. No pouco imaginativo caso de António Costa, o inimigo escolhido são os “comentadores políticos”. Segundo ele e os seus conselheiros, os “comentadores políticos” são uma espécie exótica que habita na etérea “bolha mediática”, mergulhados num desprezível privilégio e desatentos da realidade do bom “povo”. Não sabem o que verdadeiramente preocupa os eleitores e, como consequência, não devem ser ouvidos pelos eleitores.

Por estes dias, o guru da comunicação de António Costa, Luís Paixão Martins, decretou que os “comentadores políticos” pertencem ao “grupo dos 10%”. No seu livro mais recente, Como Mentem as Sondagens, conta que, no momento mais embaraçoso do caso TAP, quando as revelações prejudiciais para o primeiro-ministro se sucediam na comissão parlamentar de inquérito, estudos de opinião encomendados pelo PS indicavam que apenas 12% dos inquiridos afirmavam que a companhia aérea era um problema. Enquanto os telejornais dos canais generalistas (vistos pelo “povo”) perdiam audiência, os canais de informação (vistos pelo “grupo dos 10%”) ganhavam. Como estes canais de notícias são feitos para “um grupo minoritário” que se resume a “jornalistas, políticos, assessores, consultores, comunicadores, comentadores e analistas”, a conclusão é óbvia e tranquilizadora para António Costa: a acreditar em tudo isto, a TAP apenas preocupou o “grupo dos 10%”.

Mesmo tratando-se de uma minúscula e irrelevante agremiação, esta semana António Costa decidiu falar ao “grupo dos 10%”. O primeiro-ministro deu uma entrevista à TVI e depois prolongou-a na CNN, onde se encontra o tal “grupo minoritário”. Aconteceu-lhe, porém, um azar: é que, de repente, sem perceber muito bem como, António Costa encontrou pela frente uma integrante do “grupo dos 89%”. Esta última congregação é aquela que vive fora da “bolha político mediática” de que fala Luís Paixão Martins. É constituída por pessoas a quem faltam comboios para circular entre as cidades e as periferias, a quem faltam barcos para atravessar da margem sul para Lisboa, a quem faltam médicos para terem consultas, a quem faltam professores para ensinarem os filhos — são, genericamente, como diz a frase célebre, pessoas a quem a única coisa que sobra é mês no final do dinheiro.

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