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Antidepressivos, ansiolíticos ou estabilizadores do humor. O que são e como funcionam os medicamentos para as doenças mentais – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Out 8, 2023

Os psicofármacos são os medicamentos que têm ação no sistema nervoso central e são utilizados em psiquiatria e neurologia. É o nome que se dá aos medicamentos que têm ação no cérebro, onde é preciso atuar para modificar o percurso das doenças mentais.

Há os antidepressivos, os antipsicóticos, os estabilizadores de humor, os ansiolíticos ou hipnóticos, que são as famosas benzodiazepinas, os antidemenciais, para as perturbações neurocognitivas, como as demências, os estimulantes, utilizados, por exemplo, nas perturbações de hiperatividade e défice de atenção, e os psicadélicos, “um novo grupo de psicofármacos que, apesar de serem utilizados na depressão, não estão classificados como antidepressivos porque têm um mecanismo de ação diferente”, explica Paulo Barbosa, psiquiatra da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo e presidente da ARIS da Planície – Associação para a Promoção da Saúde Mental.

“Há psicofármacos que têm de ser tomados a vida toda porque há doenças psiquiátricas que são crónicas. Por exemplo, uma pessoa diagnosticada com esquizofrenia pode ter de fazer um antipsicótico durante o resto da vida, assim como uma pessoa com diabetes tem de fazer um antidiabético para sempre”, responde o médico, ressalvando que isso não significa que estes medicamentos causem dependência.

“Se no início, o antipsicótico serve para tratar os sintomas, depois, na ausência destes, pode ser utilizado para aquilo que chamamos a manutenção, ou seja, para evitar que os sintomas voltem a surgir. Não se trata, portanto, de causarem dependência, mas de a sua ação ser necessária para manter o doente funcional e assintomático”, explica.

Os antidepressivos e os estabilizadores de humor também não causam dependência.

“Há, no entanto, um grupo de psicofármacos que pode causar dependência, que é o das benzodiazepinas – os ansiolíticos ou hipnóticos – por causa do mecanismo de tolerância à ação do fármaco, em que para obter o mesmo efeito terapêutico, vai sendo preciso, ao longo do tempo, uma dose mais alta”, esclarece Paulo Barbosa, revelando que também os estimulantes podem provocar dependência, se não forem bem utilizados.

Desmame de um medicamento significa a diminuição progressiva da dose ao longo do tempo até à sua interrupção. “Todos os psicofármacos precisam de desmame, quando são interrompidos, não por causarem dependência, mas por causa dos eventuais efeitos que a sua retirada repentina pode provocar”, responde o psiquiatra da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo.

“Por exemplo, nas perturbações psicóticas, se interrompemos uma dose alta de antipsicótico de um momento para o outro, podemos colocar a pessoa em risco de desenvolver aquilo que chamamos de psicose de rebote. A mesma coisa com os antidepressivos e os ansiolíticos. Os estudos indicam que temos de fazer a diminuição da dose ao longo do tempo, às vezes meses, para evitar recaídas ou sintomas de abstinência que podem surgir quando estes medicamentos são retirados de forma brusca”.

Os antidepressivos são os medicamentos mais usados para tratar a depressão. Atuam nos neurotransmissores e nos neuroreceptores, influenciando a comunicação entre as células do cérebro e regulando assim o humor.

Têm vários mecanismos de ação e não funcionam todos da mesma forma. Os mais recentes e com menos efeitos secundários são os inibidores da recaptação da serotonina (SSRIs), que têm como substâncias ativas a fluoxetina, paroxetina, sertralina, citalopram, escitalopram ou vortioxetina.

“São atualmente o tratamento de primeira linha, o que usamos mais, porque são os mais seguros, mas além do perfil de segurança do medicamento, há outros elementos que vão guiar a escolha do antidepressivo: as características da pessoa, outras doenças que tenha, sintomas que apresenta”, explica Paulo Barbosa, que adianta que os antidepressivos demoram 4 a 6 semanas a fazer o seu efeito terapêutico e a dose deve ir sendo ajustada progressivamente.

Além dos inibidores da recaptação da serotonina (SSRIs), existem os inibidores da recaptação da serotonina e noradrenalina (SNRIs), cujas substâncias ativas são a duloxetina ou a venlafaxina; os inibidores da recaptação da dopamina e noradrenalina (NDRIs), que tem como substância ativa o bupropiom, os antidepressivos atípicos como a trazodona, mirtazapina e agomelatina e os velhinhos antidepressivos tricíclicos: clomipramina, amitriptilina, nortriptilina, imipramina e trimipramina.

“O que sabemos e é mais importante?”, chama a atenção o psiquiatra. “É que estes medicamentos funcionam e se um não funciona num caso, podemos trocar por outro ou combiná-los ou até potenciar com outros medicamentos de outras classes de medicação”.

Os antidepressivos são também o tratamento farmacológico de primeira linha para a ansiedade.

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As benzodiazepinas são um grupo de medicamentos habitualmente receitados para aliviar a ansiedade e o stress ou para promover o sono. Pertencendo à classe dos ansiolíticos ou hipnóticos, são vulgarmente conhecidos como “calmantes”.

Devem ser tomados em “S.O.S.” ou por um curto período de tempo, devido ao seu potencial aditivo. Provocam sonolência, a sua eficácia vai diminuindo à medida que o corpo e o cérebro se habituam – desenvolvem tolerância -, o que leva a que a dose tenha de ser aumentada para voltar a ser eficaz. Quando se toma durante muito tempo, o desmame pode ser difícil e a interrupção repentina pode provocar sintomas de abstinência graves.

“Se as benzodiazepinas forem bem prescritas, podem ser muito úteis”, considera Paulo Barbosa. “As normas de orientação clínica da Direção-Geral de Saúde recomendam a sua utilização até doze semanas. Portanto, estão indicadas e são muito eficazes para tratar um episódio agudo de ansiedade ou uma insónia. O problema é quando a doença cronifica. Quando existe uma perturbação de ansiedade, se não for feito um tratamento que ajude a pessoa a desenvolver mecanismos para lidar com essa ansiedade – a psicoterapia é a primeira linha de tratamento neste caso – podemos fazer que a pessoa fique dependente do único tratamento que lhe tira a ansiedade: as benzodiazepinas. Para isso não acontecer, há que prescrever o tratamento adequado: a psicoterapia e/ou o antidepressivo”.

“Os antipsicóticos atuam sobre a transmissão da dopamina, que é o neurotransmissor, e nós sabemos que os estados psicóticos estão relacionados com um aumento da transmissão de dopamina em algumas zonas do cérebro. Daí que tenhamos de dar um medicamento que bloqueia a captação da dopamina para impedir que haja uma transmissão tão intensa desse neurotransmissor”, explica o psiquiatra Paulo Barbosa, que considera que estes psicofármacos foram uma revolução na história da psiquiatria.

“Os mais antigos, como a cloropramazina ou o alopridol, foram muito importantes e continuam a ser utilizados. Foi a primeira vez que um medicamento mostrou eficácia no tratamento de sintomas psicóticos, o que permitiu tratar os doentes na comunidade e não os ter internados em asilos ou hospitais psiquiátricos”.

Hoje, há novos antipsicóticos, com menos efeitos secundários, como a risperidona, a olanzapina ou a quetiapina, que são os mais utilizados, e ainda os mais recentes, desenvolvidos já no século XXI, como o aripiprazol e a cariprazina, que têm um mecanismo de ação diferente. “Em vez de inibirem a transmissão da dopamina pelo bloqueio dos recetores, vão competir para os mesmos lugares onde a dopamina passa. São a última revolução dos antipsicóticos, porque têm ainda menos efeitos secundários que os de segunda geração”, diz o médico. “Os antipsicóticos são o único tratamento que sabemos que realmente funciona nas psicoses e são a base do tratamento da esquizofrenia e de outras perturbações psicóticas”.

São usados sobretudo para a doença bipolar. Os estabilizadores de humor, esclarece Paulo Barbosa, “não são propriamente homogéneos, são um conjunto de medicamentos que têm este efeito. Na verdade, os antipsicóticos também são estabilizadores de humor e também são utilizados para o tratamento da doença bipolar, mas aquilo a que comummente chamamos estabilizadores de humor são o lítio e o ácido valpróico”, diz.

“Na doença bipolar, que é caracterizada por estados depressivos que alternam ou são concomitantes com estados de mania, a utilização dos estabilizadores de humor, que conseguem tratar os extremos, tratam esta mistura de sintomas e permitem garantir uma manutenção do que chamamos um humor eutímico, que é um humor normal, assim com umas aspas bem grandes”, explica o psiquiatra.

Todos os medicamentos têm efeitos secundários e os psicofármacos não são exceção, mas a farmacologia tem evoluído precisamente no sentido de diminuir os efeitos secundários destes medicamentos, que, na generalidade, principalmente os que são utilizados em primeira linha, de acordo com Paulo Barbosa, “têm um perfil de segurança bastante bom”.

Aumento de peso, diminuição da líbido, náuseas, enjoos e dor de cabeça, sonolência. É possível que estes efeitos secundários se manifestem com a toma de qualquer um destes medicamentos, por isso é muito importante falar com o médico assistente sobre os efeitos secundários que está a sentir, para perceber quais são as opções. O que não é opção, ou pelo menos não é uma opção acertada, é interromper o tratamento sem consultar o médico.



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