“Na guerra, a verdade é a primeira vítima.” A frase não tem autoria confirmada, já foi atribuída ao dramaturgo Ésquilo ou ao político Philip Snowden, mas ganha sempre especial relevância em tempos de guerra.
O conflito entre o exército de Israel e o grupo islâmico Hamas é mais uma prova da dificuldade de impedir a disseminação de informações falsas nas redes sociais. São muitos os vídeos e imagens gráficas partilhados todos os dias na internet, frequentemente sem o contexto certo. As contradições que rodearam a explosão no hospital Al-Ahli em Gaza — em particular, sobre a origem do alegado ataque e o número certo de vítimas — são um claro exemplo dos riscos associados à disseminação de informação falsa online.
As não ameaças de líderes mundiais e os rockets de brincar. A desinformação que faz guerra nas redes sociais
Uma das publicações sobre a guerra israelo-palestiniana, que se tornou viral nos últimos dias, mostra a fotografia de um prédio prestes a desabar, a que foi adicionada uma bandeira de Israel (sugerindo que o desabamento terá acontecido em território israelita). Na legenda do post, o autor escreve que Israel sofreu um “ataque por 5 mil mísseis efetuado pelo Hamas” e que esse ataque terá acontecido “duas semanas após Joe Biden financiar o Irão com 6 milhões de euros”, numa referência ao papel dos Estados Unidos nos vários conflitos no Médio Oriente.
Numa outra publicação é partilhado um vídeo que mostra, igualmente, um prédio a desabar em Gaza, mas é referido um contexto absolutamente diferente: as imagens mostrariam um ataque realizado pelo exército israelita contra um edifício na Faixa de Gaza. Lê-se, no post, que a gravação mostra “o momento em que Israel ataca prédios na Palestina”. Olhando para logótipo e para o conteúdo, a gravação parece ter sido capturada durante uma transmissão ao vivo do canal britânico BBC. É referido, na reportagem, que se trata de um ataque israelita à torre al-Shorouk, em Gaza. Importa, no entanto, perceber se se trata de um ataque recente.
Fazendo uma simples pesquisa no Google pelo edifício referido — torre al-Shorouk —, percebemos que a infraestrutura, um prédio residencial de mais de uma dezena andares na Faixa de Gaza, foi destruída por caças israelitas em 2021. O ataque foi noticiado por vários meios de comunicação nacionais e internacionais, incluindo o Observador e, claro, a BBC. Num artigo na página oficial, a emissora britânica explica que o prédio em Gaza colapsou, depois de ser atingido por um míssil israelita. Lê-se, no site, que o “repórter da BBC Arabic Adnan Elbursh e a sua equipa continuaram a transmissão”, sem saberem que o edifício estava prestes a ruir. A notícia data de 14 de maio de 2021, ou seja, mais de dois anos antes do ataque do grupo paramilitar Hamas contra Israel, a 7 de outubro deste ano, e que levou a uma nova escalada do conflito no Médio Oriente.
Os confrontos entre Israel e o Hamas já se prolongam há décadas. Por altura da gravação deste vídeo, em maio de 2021, o exército israelita e o grupo extremista enfrentavam-se em Gaza, num conflito que durou 11 dias e provocou mais de 200 mortos. Os ataques terminaram na sequência de um cessar fogo intermediado pelo Egito, e que levou milhares de palestinianos às ruas em celebração.
Cessar-fogo entrou em vigor às 2h. Milhares de pessoas celebraram nas ruas da Faixa de Gaza
Ou seja, as imagens que mostram um prédio a colapsar estão, de facto, relacionadas com o conflito entre Israel e o Hamas, mas não são recentes. Foram gravadas em 2021, por altura de um outro escalar de tensões no Médio Oriente. Mais de dois anos depois, o cenário na Faixa de Gaza volta a ser de morte e destruição, com o enclave a atravessar uma situação humanitária preocupante, mas, desta vez, sem novo cessar fogo à vista.
Conclusão
Ao contrário do que alegam as publicações, a fotografia e o vídeo que mostram um prédio a desabar na Faixa de Gaza não foram registados durante a mais recente fase do conflito entre Israel e o Hamas, que teve início a 7 de outubro. O ataque aconteceu, de facto, no enclave palestiniano e na sequência de confrontos entre o exército israelita e o grupo islâmico, mas foi registado há mais de dois anos: em maio de 2021.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ENGANADOR
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.
