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As idades de Natália – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Nov 6, 2023

Pode dizer-se que haverá sempre uma faceta de Natália Correia por descobrir. Outras tantas sobre as quais ainda hoje se desvendam particularidades. 30 anos depois da sua morte e num ano em que se comemora também o seu centenário, voltar à história daquela que foi uma das mais importantes autoras da segunda metade do século XX português é inevitável. E dessa mesma inevitabilidade surgiu O Dever de Deslumbrar, peça com encenação de Ana Rocha de Sousa, a partir da biografia homónima de Filipa Martins, que estará em cena no Teatro da Malaposta, em Odivelas, a 10 e 11 de novembro, no âmbito da abertura da 17.ª edição do LEFFEST — Lisboa Film Festival. Seguem-se apresentações no espaço Escola de Mulheres, de 30 de novembro a 3 de dezembro, e no Teatro Turim, em Benfica, de 5 a 21 de janeiro de 2024.

No cenário, uma cama com folhas de papel, uma mesa de maquilhagem, uma secretária e diversos objetos colocam-nos num espaço de profunda intimidade. Ouve-se a voz de Natália. Há uma bailarina em palco (Ana Jezabel) e duas mulheres (Teresa Tavares e Paula Mora), que personificam duas Natálias em diferentes momentos da sua vida. Trilham-se memórias, entre imagens de arquivo que recordam a verdadeira Natália Correia e os diálogos, em que se fala da infância, da ausência do pai e da mulher artista e ativista que se foi formando. “Nasci numa família terrivelmente retrógrada, conservadora, a que podemos chamar ‘ultramontana’” recorda a Natália mais velha. Não falta a boquilha em punho e a palavra afiada. Mas há também espaço para um diálogo emocional e de perspetiva sobre o seu posicionamento face à história recente do país.

A peça, que marca a estreia na encenação da realizadora Ana Rocha de Sousa, surge, necessariamente, como “homenagem” à autora de O Vinho e a Lira. Mas é mais do que isso. Num espetáculo multidisciplinar, onde se enceta um falso monólogo percorremos a obra, vida, pensamento, declarações públicas e privadas de Natália Correia, sem que se torne necessariamente num exercício performativo puramente biográfico. Pelo contrário: o facto de assistirmos a uma conversa de Natália Correia consigo mesma abre uma outra perspetiva, que vai para lá daquela que conservamos no imaginário coletivo. Vemos uma mulher que é feita de coragem, destemida e irreverente, mas também uma Natália que falha, que se contradiz e que sofre. É a Natália Correia que fazia troça dos boatos que sobre ela eram lançados, mas a também a Natália Correia que se emociona profundamente quando se recorda do arquipélago dos Açores, onde nasceu em 1923.

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