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A tristeza crónica de Rubem Braga – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Nov 12, 2023

“Quem estimar a moderação dourada / escapará, seguro às sordícias de uma casa / degradada; e escapará, regrado, ao palácio / causador de inveja”, canta Horácio numa das suas odes incluídas na Poesia Completa, agora traduzida por Frederico Lourenço. E assim termina essa ode: “Em situações angustiantes, mostra-te corajoso / e forte. Sabiamente, também, diante / de vento demasiado favorável, encurtarás / as velas inchadas.” Porém, não é do grande poeta latino que quero falar – a edição da Quetzal merece toda a atenção e os encómios que alguém, mais habilitado do que eu, lhe dedicará – mas desse cronista horaciano que foi Rubem Braga (1913-1990), praticante ativo nas milhares de crónicas que escreveu da “moderação dourada” recomendada por Horácio.

Quem ler as crónicas reunidas em Desculpem Tocar no Assunto (ed. Tinta-da-China) concluirá que a tristeza é o sentimento que as modula. Mas a tristeza de Braga não é triste, pesada, depressiva. É suave, terna, tranquila. Uma tristeza quase alegre, reconfortante. Uma tristeza que não bate, aconchega. E nestas crónicas a tristeza nunca é despejada a balde sobre os leitores. É aspergida como o incenso de um turíbulo imaginário, um vago perfume que penetra a consciência do leitor. Porque se a alegria é a melhor coisa que existe, é sabido que sem um pouco de tristeza não há samba, não há crónica.

A tristeza é apenas uma das qualidades do cronista-só-cronista Rubem Braga. Há, em todas estas crónicas, outras da mesma família: a timidez, por exemplo. “Sou um homem de natural tímido, e ainda mais no lidar com mulheres” ou “embora escreva com certa desenvoltura sobre amores e damas, sou, na vida prática, um pavoroso tímido”, escreve o cronista, embora, na verdade, seja pouco interessante apurar se era uma característica do homem, uma timidez sincera, ou um artifício literário, porque, tal como a tristeza, uma vez transposta para a página, ela é atenuada e a sua natureza é subtilmente transformada.

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