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Quando nem tudo é como parece ser… – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Dez 4, 2023

A obtenção de níveis mais elevados de Educação está por norma associada à melhoria de condições de vida, a melhores oportunidades de emprego e de progressão nas carreiras profissionais e a tantos outros benefícios individuais e coletivos que nos levam a considerar a Educação como o principal elevador social. Por outro lado, é bem sabido como a Ciência e a Inovação suportam maiores índices de desenvolvimento nas diferentes regiões do globo.

O Orçamento de Estado 2024 (OE2024) procura garantir os instrumentos financeiros para a Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (CTES), contribuindo para a concretização das metas definidas até ao final da década: uma taxa média de 60% dos jovens com 20 anos a frequentar o ensino superior; 50% de graduados de ensino superior na faixa etária dos 30-34 anos; e, alcançar um investimento global em I&D de 3% do PIB.

O OE2024 para a CTES aponta para um crescimento de 7,6% face a 2023, com uma despesa total prevista na ordem dos 3597,5 Milhões de euros, 49% financiadas pelos impostos dos contribuintes portugueses e cerca de 40% pelos Fundos Europeus e Receitas próprias. O respetivo Relatório que o acompanha salienta como principais características do OE2024 para a CTES um aumento de 138 Milhões de euros (+ 9,6%) no financiamento ao Ensino Superior, um reforço na Ação Social destinada ao ensino superior na ordem dos 70 M€ e um aumento de 5 % na dotação da Fundação da Ciência e Tecnologia.

Porém, apesar das aparentes boas notícias, nem tudo é o que parece ser…

Desde logo, a meta de 3% do PIB em despesas de I&D parece ainda distante. Em 2022, este indicador situou-se em 1,73% do PIB, num total de 4 134 M€. Nos últimos 7 anos, a despesa em I&D subiu “apenas” 0,49% do PIB e, a manter-se este ritmo de crescimento, chegaremos a 2030 com 2,3% do PIB.

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No OE 2024, do total da despesa consolidada com a CTES, 52,5% serão despesas com o pessoal. Aliás, a despesa de pessoal da Ciência e da Educação representa mais de um terço (35%) do total de despesas com o pessoal da Administração Central.

Por outro lado, de acordo com o relatório da OCDE (Education at a Glance, 2023), tomando 2020 como referência, e considerando todas as fontes de financiamento, Portugal gasta 5,1% do seu PIB em despesas de Educação (em todos os níveis de escolaridade), o que está em linha com a média dos países da OCDE. Contudo, 25% daquele montante é dirigido ao Ensino Superior, o que compara mal com a média da OCDE, que é de 29%. O mesmo estudo assinala que em média, para todos os níveis de ensino, Portugal gasta anualmente cerca de 10 100€ por estudante (ajustado pelo poder de compra), com a média da OCDE de 11 800€. Esta despesa equivale a 31% do PIB per capita, o que é superior à média da OCDE de 27%, sendo que, em comparação com a média dos países da OCDE, a despesa por estudante do ensino superior é muito menor do que a despesa por estudante no ensino não superior.

Voltando ao OE 2024 e aos 3359,6 milhões de euros da dotação de despesa efetiva não consolidada do Programa, considerando como aproximação os 359.397 estudantes inscritos nas Instituições de ensino superior públicas em 2022/23, facilmente se estima um custo anual por estudante de cerca 9300€! Se as propinas do ensino superior para os ciclos de curta duração, Licenciaturas e mestrados integrados, que no conjunto representam cerca de 75% dos estudantes, fixam-se em 697€, o esforço financeiro destes estudantes e das suas famílias cobre tão somente cerca 7,5% do custo real total do aluno em cada ano. Outros 20% são cobertos pelos Fundos Europeus, 12,5% por Receitas próprias das IES públicas, 11% de outras transferências entre entidades da Administração Central, e os restantes 49% são pagos por todos os contribuintes portugueses, mesmo aqueles cujos filhos não acedam ao ensino superior! 

Assim, no domínio das Políticas Públicas Educativas, o custo quase simbólico das propinas no ensino superior público, que aparenta ser uma política de equidade e igualdade de oportunidades para as famílias menos favorecidas, é na verdade uma ilusão. Tal como citado pelo Instituto +Liberdade no trabalho sobre Custo médio de um estudante no ensino superior para a instituição de ensino e fontes de financiamento – Univ de Lisboa e Univ. do Porto, o Banco de Portugal (no seu boletim económico de maio 2022) refere que em Portugal apenas 19% dos filhos dos pais com uma escolaridade até ao 9º ano completam o ensino superior, e esta percentagem desce para 10% quando as famílias com pais com aquele nível de escolaridade acumulam com dificuldades financeiras. Donde, é fácil concluir que a larga maioria dos estudantes do ensino superior público são provenientes de famílias portuguesas economicamente mais favorecidas, cuja formação é, no essencial, paga por todos nós, mesmo por aqueles que são provenientes de setores mais fustigados na sociedade portuguesa, mesmo aqueles que não usufruem desta oportunidade.

Este conjunto de informação referente à despesa em Educação assume maior relevância quando a nossa atual performance apresenta ainda fortes debilidades.

A geração “nem-nem” tem vindo a diminuir, mas em Portugal esta tipologia de jovens representa ainda 8,5 %, que se estima em cerca de 140 mil jovens.

Apesar do crescimento verificado nos últimos anos, apenas 44% dos jovens adultos com idades entre os 25 e os 34 anos completou o ensino superior, e deste grupo populacional há em Portugal ainda 17% (cerca de 190 mil) sem o ensino secundário completo, quando na média da OCDE este indicador é de 14%.

A procura do ensino de dupla certificação (vias profissionalizantes) tem aumentado consideravelmente nos últimos anos. De acordo com os dados da DGEEC, o número de estudantes a frequentar esta tipologia de ensino ultrapassava, já em 2022, 40% do total dos cerca de 397 mil estudantes do ensino secundário. Porém, de acordo com os dados da OCDE, em Portugal, apenas 63% dos estudantes dos cursos de dupla certificação termina os seus estudos no período previsto, 28% abandonam-nos antes da sua conclusão, e, dos que o concluem, não mais de 18% prossegue os seus estudos para o ensino superior.

Entre a população ativa (25 aos 64 anos), apenas 31% tem o ensino superior (e 29% tem apenas o ensino secundário).

Dos estudantes que acedem ao ensino superior pela 1ª vez (à volta de 155.000 em 2022/23), cerca de 12% abandona os seus estudos antes do início do 2º ano curricular. Entre os estudantes que ingressam numa Licenciatura, apenas 30% termina este grau nos esperados 3 anos de duração deste ciclo de estudos.

O Relatório que acompanha o OE 2024 afirma que o Programa Orçamental tem como objetivos estratégicos: Investir no ensino superior e na ciência com mais estabilidade, transparência, coesão e sustentabilidade; Promover a qualidade, equidade e o sucesso num ensino superior de qualidade; Consolidar a ciência e ensino superior como instrumentos de desenvolvimento sustentável e inclusivo (sublinhado nosso).

Se calhar, é melhor olhar de novo… E facilmente se concluirá que nem tudo é como parece ser.



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