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uma tradição botânica ilustrada – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Dez 17, 2023

Ao longo dos últimos trinta anos, o Clube do Colecionador dos CTT editou bons livros alusivos a séries temáticas das suas estampilhas postais, num elenco de títulos sempre reportado à portugalidade ou à presença de Portugal no mundo globalizado que este pequeno país ajudou a criar, mobilizando para tal os especialistas mais reconhecidos nas respetivas áreas — aliás as mais diversas, como falcoaria, ciência náutica, vinhas velhas, festas e romarias, indústria têxtil, arqueologia, escultura, cinema, arte do jardim, tertúlias em cafés, calçada portuguesa, gastronomia, ourivesaria arcaica, museus centenários, ferrovia, rios, heranças multiculturais, banda desenhada e muitas outras — e designers gráficos de comprovado mérito, como José Brandão, por exemplo.

Hoje, as tiragens baixaram a metade e os volumes perderam o texto em língua inglesa que os notabilizava, mas a busca de temas curiosos e de evidente interesse mantém-se intacta e concretiza-se em títulos como esta Viagem Botânica por Portugal de Luís Mendonça de Carvalho, também autor de As Plantas e os Portugueses, publicado em 2019 pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, e de que este álbum é claramente um sucedâneo ilustrado, diria mesmo ricamente ilustrado e com especial requinte e saber. A primeira fotografia é a da fadista Amália Rodrigues, “símbolo nacional”, com um dos seus muitos vestidos floridos, junto a um transbordante ramo de rosas, ela que um dia disse não saber o motivo de gostar tanto de flores (e ver-se a consultar um psicanalista por causa disso), enquanto o texto introdutório discorre sobre as migrações planetárias de plantas na sua relação com a formação e a história do nosso país, e o autor lembra que duas vergônteas de louro passaram em 1911 a constar da nova bandeira, a revolução de 1974 foi chamada “dos cravos” e em 2011 o parlamento instituiu o sobreiro como “árvore nacional” (p. 10) e a nossa toponímia “é riquíssima em nomes que aludem às plantas” (p. 11). No Monumento aos Restauradores, em Lisboa, a Vitória ergue a coroa da Glória (loureiro) e a palma do Triunfo (palmeira), p. 156. Parece, ainda assim, bastante pouco, diante do muito e bom que adiante se irá encontrar.

Esta viagem pela etnobotânica associada à arte e aos ritos populares começa pela distante ilha do Corvo, onde se distinguem engenhosas fechaduras em cedro-do-mato (atualmente em viva recuperação por novos artesãos) e ainda se fazem capachos para a soleira das casas com as folhas secas do dragoeiro (em São Miguel usam brácteas de milho), para depois encontrar no Faial xailes bordados a palha de trigo ou centeio sobre tule e, sobretudo, as minuciosas esculturas em miolo de figueira, de assombroso virtuosismo técnico e artístico, destacando a grande exposição no Museu da Horta de trabalhos feitos por Euclides Silveira da Rosa (1910-78). Em São Jorge, a Primavera é celebrada com bolos de véspera “carimbados” com pequenos chavões modelados no mesmo cedro-do-mato ou em faia-das-ilhas, em que são gravados motivos florais alusivos e a coroa do Divino Espírito Santo (p. 17). Em São Miguel, muito mais que bordados em dois tons de azul sobre linho, inspirados nos padrões e cores de velhas louças chinesas, impressionam os coloridos tapetes de flores que se estendem no longo percurso da procissão do Senhor Santo Cristo dos Milagres no quinto domingo depois da Páscoa.

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