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Nem tudo são preocupações – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Fev 11, 2024

As preocupações que temos são nossas no sentido em que nos atormentam sobretudo a nós, e ocupam o nosso tempo e a nossa diligência. Conforta-nos poder encontrá-las nos jornais, na arte, nas leis, nos filmes e nas conversas das outras pessoas. Comunicamos com o mundo através desse conforto, e é até possível que só exista para mim esse mundo se eu reconhecer nele semelhanças com as minhas preocupações. Reparo sempre com satisfação que um filme fala de mim, e que uma lei me ofende em especial, que a chuva me suja o carro acabado de lavar, e que milhares de pessoas falam do que eu falo e se indignam com aquilo que me indigna.

A fraternidade supõe uma certa quantidade de desgraça, em que pessoas diferentes se queixam das mesmas coisas, e daquilo de que eu me queixo; de pessoas que consideram relevantes as preocupações que eu tenho, ou preocupações muito parecidas com as minhas. Não se deve subestimar o efeito de vermos as nossas dificuldades multiplicadas por cem mil. A realidade é para a maior parte das pessoas um efeito estatístico, e o mundo ganha consistência se num determinado momento as minhas opiniões forem as opiniões de todas as pessoas à minha volta.

Há a considerar neste concerto a diferença entre aqueles que anunciam preocupações colectivas em voz alta e os civis que reconhecem a sua ralação mofina nos assuntos anunciados pelas conversas de terceiros. Os civis são genericamente encorajados a procurar ecos daquilo que os apoquenta; mas quem produz esses ecos faz mais coisas. Não é incomum que imaginem estar a iluminar as vidas dos civis preocupados que lhes prestam atenção. São a parte principal de uma relação complexa entre pessoas preocupadas à procura de pessoas com as mesmas preocupações, e iluminados à procura de pessoas a quem iluminar.

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