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Ucrânia, Trump, extrema-direita. Seis desafios para Mark Rutte, o novo líder da NATO – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Out 1, 2024

Contudo, a NATO ainda está longe de ter o financiamento de que precisa por parte de todos os seus estados-membros, com países como Itália e Espanha a manterem-se entre 1% e 1,5%. Devido à crónica incapacidade de uma boa parte dos países de cumprirem a sua meta orçamental, o financiamento da NATO tem sido assegurado em grande parte pelos Estados Unidos — o que no passado já levou Donald Trump a argumentar que não pode ser Washington a pagar a defesa dos restantes membros da NATO.

Mark Rutte terá agora o desafio de garantir que a meta de 2% do PIB de cada estado-membro investido em defesa é, finalmente, cumprida.

É neste contexto que se pode ler outro dos grandes desafios para a liderança de Mark Rutte: a possibilidade de Donald Trump regressar à Casa Branca nas eleições norte-americanas do próximo mês.

Como Presidente dos EUA, Trump nunca escondeu o seu descontentamento com o facto de Washington assegurar uma grande parte do financiamento da NATO, pagando a proteção militar de vários países que, cronicamente, não cumpriam as suas metas orçamentais de defesa. Chegou mesmo ao ponto de equacionar retirar os EUA da NATO, como disse a imprensa norte-americana em 2019.

Agora, a possibilidade de Trump regressar à Casa Branca é real. Na campanha eleitoral, o antigo Presidente chegou mesmo a dizer que “encorajaria” Vladimir Putin a invadir os países da NATO que não pagassem o suficiente, ideias vistas como “problemáticas” dentro da aliança. Nos seus comícios de campanha, Trump galvanizado os seus apoiantes com a perspetiva de reduzir o apoio militar à Ucrânia. A hostilidade de Trump em relação à NATO é suficiente para deixar no ar uma questão: um regresso à Casa Branca pode mesmo ditar o fim da aliança?

“Mais do que nunca, os europeus estão sozinhos.” Trump na Casa Branca pode ditar o fim da NATO?

O Politico escreve que, caso Trump ganhe as eleições e cumpra a promessa de cortar o financiamento à Ucrânia, poderá estar em causa a credibilidade da NATO no apoio a Kiev, já que os EUA têm sido o principal financiador do governo de Zelensky na luta contra Moscovo. Além disso, poderá estar em causa a futura adesão da Ucrânia à NATO, um compromisso já assumido pelos estados-membros. Na tomada de posse como secretário-geral, Mark Rutte garantiu que a Ucrânia será uma prioridade da NATO: se Trump ganhar as eleições (e as sondagens mais recentes dão conta de uma corrida muito renhida), o holandês vai ter de tentar manter essa prioridade contra o maior financiador da aliança.

Esta terça-feira, aos jornalistas, Mark Rutte garantiu que não está “preocupado” com a possibilidade de Trump ganhar. “Conheço ambos os candidatos muito bem”, afirmou. “Trabalhei quatro anos com Donald Trump. Era ele quem nos estava a tentar convencer a gastar mais e conseguiu, porque neste momento estamos num nível de investimento muito maior do que estávamos quando ele tomou posse.” Quanto a Kamala Harris, Rutte garantiu que “tem um historial fantástico como vice-presidente” e é “uma líder altamente respeitada”, pelo que também conseguirá trabalhar bem com ela.

Como secretário-geral da NATO numa Europa marcada pela guerra Rússia-Ucrânia, Mark Rutte terá de gerir também várias sensibilidades dentro do continente europeu.

Por um lado, terá de dar uma atenção especial aos países da Europa de Leste, que são aqueles que estão mais perto da guerra e que mais rapidamente podem sofrer as consequências de uma escalada que atinja o território da NATO. Por outro lado, como escreve o Politico, existe na região do Leste europeu um ressentimento por nunca ter havido um secretário-geral da NATO oriundo dos países de Leste, estando o cargo quase sempre confiado a figuras da Europa Central ou do Norte.

Apesar de vários países de Leste integrarem a NATO há quase três décadas, na sequência do colapso do comunismo, continuam a ser vistos como secundários na aliança. Uma forma de mitigar este sentimento poderá ser a escolha de figuras do Leste europeu para cargos na secretaria-geral da NATO, como o lugar de número dois.

Ao mesmo tempo, Mark Rutte assume funções numa Europa marcada pelo crescimento de partidos de extrema-direita cujos líderes não têm escondido alguma proximidade e admiração por Vladimir Putin — ao mesmo tempo que demonstram desconfiança e ceticismo em relação à NATO. O caso de Viktor Orbán na Hungria é o mais evidente numa Europa em que líderes como Marine Le Pen (França) ou Geert Wilders (Países Baixos) se têm aproximado cada vez mais de posições de poder.

Rutte terá a complexa tarefa de tentar manter o sentimento pró-NATO na Europa apesar do crescimento destes partidos.

O novo secretário-geral da NATO tomou posse poucas horas depois da mais recente escalada da guerra no Médio Oriente, com o início da incursão terrestre de Israel no sul do Líbano. O aumento da tensão no Médio Oriente deverá marcar a fase inicial do mandato de Mark Rutte à frente da NATO — apesar de, como notava recentemente a Al Jazeera, o tema da Faixa de Gaza ter estado praticamente ausente da mais recente cimeira da NATO, em Washington, em julho deste ano.

Apesar de o tema ter estado arredado da agenda, vários líderes de países da NATO usaram as suas intervenções para dizer que a aliança tem a obrigação de ajudar Gaza da mesma forma que ajuda a Ucrânia — ao mesmo tempo que os Estados Unidos continuavam a anunciar o apoio militar a Israel.

Este verão foi também anunciado que a NATO vai abrir na Jordânia a sua primeira delegação no Médio Oriente, o que indicará uma maior atenção e presença da aliança atlântica naquela região. A NATO é bastante impopular no Médio Oriente, sendo associada aos Estados Unidos e à sua intervenção pró-Israel — e a abertura de uma delegação na Jordânia foi vista por alguns no Médio Oriente como uma traição por parte daquele país.

À Deutsche Welle, vários especialistas sublinhavam recentemente que é improvável que a NATO se queira aproximar dos conflitos atualmente em curso no Médio Oriente, envolvendo Israel, o Hamas, o Hezbollah, os Houthis e o Irão — e que a abertura da delegação resulta de um planeamento anterior de longo prazo, e não de uma resposta à tensão atual. Ainda assim, a partir da Jordânia, a NATO ganha uma nova posição a partir da qual poderá estar mais próxima de um dos pontos de tensão mais prementes dos dias de hoje.

Mark Rutte, que foi primeiro-ministro holandês durante mais de uma década e desenvolveu uma reputação como construtor de consensos, terá também de colocar as suas capacidades diplomáticas ao serviço da NATO num mundo em que as tensões entre o Ocidente e potências como a Rússia ou a China se adensam.

Entre as suas três grandes prioridades para a NATO, a par do aumento do investimento por parte dos estados-membros e do apoio à Ucrânia, Mark Rutte colocou o reforço de parcerias entre a aliança e países de todo o mundo, já que a segurança “tem de ser um esforço de equipa”.

A nível global, a aproximação de países como a China ou a Coreia do Norte à Rússia no contexto do apoio aos seus esforços de guerra contra a Ucrânia levam o Ocidente a aumentar o seu nível de preocupação em relação à Ásia — uma preocupação intensificada ainda pela situação de Taiwan. Nesse sentido, o reforço de relações com países aliados no Oriente, como o Japão, será também uma das linhas de ação de Mark Rutte.





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