• Dom. Out 6th, 2024

Um ano depois ninguém tem uma boa solução para Gaza. Só soluções menos más – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Out 6, 2024


É por isso que alguns lugares não são hoje e provavelmente nunca voltarão a ser como era desse dia. Netiv HaAsara é um desses locais. Situada a apenas uma centena de metros da linha que nos mapas aparece definida como “linha do armistício de 1950”, no fundo a linha de fronteira que resultou da guerra de independência de Israel, desta aldeia avistam-se as casas das povoações mais a norte de Gaza e em tempos chegou a ser possível ver campos de treino do Hamas.

Mesmo assim, nesta povoação – uma comunidade agrícola conhecida como moshav, com um modelo de vida semelhante ao coletivismo dos kibutz – uma artista local tinha criado uma instalação que atraía sobretudo gente que sonhava com a paz entre israelitas e palestinianos.

Chamava-se – chama-se – “O Caminho para a Paz” e era uma enorme instalação a que cada um podia acrescentar um pequeno azulejo ou emblema colorido com uma frase alusiva à paz. Hoje já ali não chegam visitantes, apenas militares e jornalistas como nós. E hoje, junto ao enorme muro de cimento que protegia a aldeia dos tiros disparados do outro lado da fronteira, há agora um jardim de oliveiras – oliveiras velhas, retorcidas, com décadas ou mesmo séculos de vida


3 fotos

Não estavam ali antes, mas estão ali agora porque junto a cada uma delas uma pequena placa com um nome e duas datas – a do nascimento e a da morte – recordam as mais de duas dezenas de habitantes de Netiv HaAsara que morreram nesse 7 de outubro. E há também laços e bandeiras amarelas, como há por todo o lado em Israel, para que ninguém se esqueça que ainda há reféns em Gaza. E há ainda o ruído de explosões ao fundo, pois Gaza é mesmo ali e a guerra prossegue.

Há quem olhe para aqueles muros e para aquelas torres de vigia – estão sempre a dizer-nos para não nos aproximarmos mais –, como a consequência inevitável de um erro cometido há 20 anos, a decisão de um governo de Ariel Sharon de levar Israel a abandonar por completo a sua presença na Faixa de Gaza, entregando-a por completo à gestão da Autoridade Palestiniana.

“Nunca devia ter acontecido”, diz-nos Amir Aviv, brigadeiro general na reserva, fundador de um think tank dedicado à defesa e segurança e claramente um “falcão” que fala connosco não longe desse mural dedicado à paz. “Eu na altura era ajudante de campo do chefe de estado maior e estive nalgumas reuniões em que isso foi decidido. Nós éramos contra. O Shin Beth (o serviço de informações interno) também era contra. Mas Sharon, que admiro como génio militar, entendeu que tínhamos mesmo de sair de Gaza. Ele também era um político e tinha outras considerações”.

E era de facto um político. Herói em várias guerras, comandante audacioso que se destacara principalmente na guerra do Yom Kippur, quando a sua coluna de tanques foi mandada parar quando já ameaçava o Cairo, depois várias vezes primeiro-ministro, fizera uma viagem política da direita para o centro (começou por pertencer ao Likud, o partido que ainda hoje é o de Netanyahu, fundaria depois um partido centrista com um histórico dos trabalhistas, Shimon Peres, e em 2004 surpreendeu o mundo ao decidir uma retirada unilateral da Faixa de Gaza.

Na verdade a retirada começara mais cedo, em 1994, depois dos acordos de paz de Oslo, altura a partir da qual o governo das cidades foi entregue aos palestinianos. O próprio Yasser Arafat começou por se instalar em Gaza quando regressou à Palestina, mas desde o início que a Autoridade Palestiniana teve dificuldades em controlar um território onde a presença do Hamas já era muito forte. Tão forte que pouco depois da retirada total de Israel aquele movimento fundamentalista acabaria por assumir o controlo total, num golpe de Estado durante o qual foram sumariamente executados muitos dos apoiantes laicos da Fatah, o partido de Arafat.





Source link

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *