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Tão grave como o colonialismo é a opressão da mulher nas sociedades africanas, diz investigadora – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Nov 7, 2024

Tão grave como a opressão colonial foi a tradição da opressão sobre as mulheres nas sociedades patriarcais africanas, que ainda empurram a mulher para a cozinha, defende, em entrevista à agência Lusa, a investigadora Inocência Mata.

As constituições dos países africanos de língua oficial portuguesa são bastante revolucionárias. Teoricamente as mulheres têm os mesmos direitos do que os homens, mas não é o que acontece efetivamente”, garantiu Inocência Mata, uma das responsáveis pela organização de um encontro que reúne em Lisboa, na sexta-feira e no sábado, mulheres que lutaram contra o fascismo e o colonialismo, em Portugal e nos países africanos que se tornaram independentes com o golpe militar de 25 de Abril de 1974.

De acordo com a investigadora, as mulheres têm ainda uma condição “muito subalterna” nos países africanos de expressão portuguesa, mesmo que presentes na arena política.

“Aqui há anos ia passando uma lei em Moçambique, num parlamento em que havia deputadas, em que o homem que violasse uma mulher, desde que se dispusesse a casar com ela não era processado. O crime terminava desde que ele se dispusesse a casar com ela”, contou a investigadora da Universidade de Lisboa, quando questionada sobre a condição da mulher africana após as independências nas antigas colónias portuguesas.

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Para Inocência Mata, falta fazer “a revolução mental, cultural”, a começar nas próprias mulheres.

“Agora fala-se muito de empoderamento, mas antes tem de falar-se de emancipação, porque há muitas mulheres empoderadas que não são emancipadas em casa”, afirmou.

As mulheres, referiu, continuam a ser tratadas como “cidadãs de segunda” nestas sociedades, ainda que lhes esteja assegurado constitucionalmente um direito político.

“Tenho um artigo em que parto da afirmação de dois candidatos à Presidência da República em relação às suas adversárias. Um disse que a mulher é coisa para ficar no cantinho da cama. E o outro, 20 anos depois (por caso, pai e filho), disse da sua adversária que ela devia ir para casa cuidar do marido”, exemplificou.

No Congresso Internacional Mulheres na Luta contra o Fascismo e o Colonialismo, que vai decorrer na Torre do Tombo, estarão presentes mulheres que partilharam com os homens a luta pela libertação nos territórios africanos sob domínio português e que, segundo a investigadora, eram vistas como “a flor” da guerrilha.

Na opinião de Inocência Mata, o papel das mulheres nas lutas de libertação foi reconhecido, mas não foi projetado.

A este propósito, recordou uma entrevista à escritora Alda Espírito Santo, em que lhe perguntaram a razão de nunca ter casado. “Ela disse – Olhe, nenhum homem ia querer casar comigo, porque eu não me submeto, a minha consciência não se submete. Nenhum homem ia aceitar que eu saísse à noite para ir a uma reunião”.

“Ela foi bem clara! O que quis dizer foi ´uma coisa é a luta política´, mas havia outra luta e, aliás, depois da independência ela pugnou muito pela emancipação da mulher”, disse a investigadora, referindo-se à autora são-tomense como alguém que tinha consciência de que tão grave como a opressão colonial era a opressão da tradição em relação à mulher.

“É preciso ter em conta que houve a luta contra o colonialismo e vemos isso também nas poetisas Noémia de Sousa, Maria Manuela Margarido, vemos que falavam muito da condição do homem africano e da mulher, mas sempre na perspetiva colonial, nunca referiam que as mulheres sofriam uma primeira opressão, que era em casa”, observou.

No congresso dos próximos dias, no âmbito dos 50 anos do 25 de Abril, serão abordados temas como a revolução feminina e outras formas de cidadania, por Helena Carvalhão Buesco, professora aposentada da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, numa iniciativa que junta investigadoras e ativistas de vários países, impulsionada pelo Movimento Democrático de Mulheres (MDM).

“Quisemos trazer a participação das mulheres no 25 de Abril, tanto das mulheres portuguesas, como das mulheres africanas”, explicou Inocência Mata, destacando as mesas de depoimentos “Memórias e Testemunhos”, com antifascistas portuguesas e anticolonialistas de Angola, de Moçambique, de São Tomé e Príncipe e de Cabo Verde.

“O que é que elas fizeram, o que é que aquelas pessoas fizeram. Há mesas de estudo, a primeira vai falar da história da resistência no feminino, na luta armada, na luta clandestina, na literatura, nas artes e há uma mesa de testemunhos”, indicou.

O congresso dedicará também um painel à investigação que está a ser produzida, nomeadamente sobre a participação das mulheres nas lutas pela independência, nomeadamente na guerrilha.

“As mulheres eram sempre vistas como os elementos que carregavam as munições, as armas, tratavam das crianças. Também fizeram isso, como é óbvio. Mas também tiveram um papel na luta armada”, acentuou Inocência Mata.





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