Na entrevista que deu esta quinta-feira à CNN Portugal, António José Seguro falou na necessidade de “convergência” e “diálogo” sobretudo entre os partidos do centro moderado. Recusa falar de um bloco central formal, mas a ideia está-lhe colada à pele — estratégia que não podia estar mais nos antípodas do que Pedro Nuno Santos defende como desejável para o país.
Aliás, isso mesmo foi recordado esta sexta-feira por Adalberto Campos Fernandes numa entrevista ao Observador. O socialista é apoiante de outro nome presidenciável nesta área política, Mário Centeno (que ainda não se pronunciou, embora vá alimentando o tabu) e lembra que Seguro tem um “alinhamento — e bem — com uma visão ao centro do país, que será muito diferente daquela que o próprio PS tem em relação à construção política do próprio partido”.
Adalberto Campos Fernandes coloca, de resto, Centeno em “melhores condições” do que Seguro para ganhar as eleições presidenciais. O antigo ministro da Saúde tem estado em conversas para promover a candidatura do atual governador do Banco de Portugal à Presidência da República — e no grupo há até elementos da direita, como noticiou o Observador em setembro.
Esta frente mostra como Mário Centeno também quer mostrar que pode somar eleitorado do centro-direita ao apoio natural do universo socialista. Mas estes argumentos não convencem os apoiantes de António José Seguro, que sabem que não haverá, naturalmente, espaço para os dois na corrida presidencial. Para quem prefere Seguro, Centeno é apontado como “uma das caras da “geringonça“, o que pode provocar alguns calafrios ao centro moderado.
Em contrapartida, quem defende o atual governador do Banco de Portugal diz que Centeno era o ministro de quem “a geringonça não gostava“, numa referência à forma como Centeno pressionava para que o Governo não se desviasse do rumo das “contas certas” — para grande desencanto de alguns ministros setoriais e contestação dos partidos mais à esquerda. “A geringonça funcionou apesar de Centeno”, graceja-se no partido a este respeito.
No Observador, João Costa, antigo ministro da Educação, foi confrontado com a ponderação presidencial de Seguro e não se mostrou particularmente efusivo. Quando questionado muito diretamente sobre se o antigo secretário-geral do é um bom candidato, João Costa (que é muito próximo da atual líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão) preferiu sublinhar a importância de existir na futura corrida presidencial um candidato de esquerda. “O que é fundamental é que a esquerda e o PS em particular consiga ter uma posição mais forte nas presidenciais do que as que teve nas últimas vezes”, limitou-se a dizer o socialista.
O ex-ministro da Educação não foi sequer capaz de esconder que ainda aguarda que apareça gente com outro perfil para decidir o seu apoio. “Estar a aparecer um candidato como António José Seguro, com grande experiência política, é positivo. Mas é tempo de vermos outros nomes que às esquerda poderão vir a aparecer”, afirmou João Costa.
Entre os seguristas ouvidos pelo Observador, este argumento conta pouco — a tal ideia de que é preciso aparecer uma figura capaz de agregar o universo da esquerda e do centro-esquerda para disputar com seriedade as eleições é redutora e está desfasada da realidade. “Só se ganham presidenciais ao centro e não à esquerda”, comenta um dos apoiantes de António José Seguro.
De ex-ministros do PS a Nobre Guedes. Conversas para candidatura de Centeno a Belém começaram há um ano e estendem-se à direita
“É um bom candidato, mas não é melhor do que Centeno”, acrescenta ao Observador um dirigente do partido, que aponta ainda o que considera ser uma fragilidade o antigo líder: “Dez anos é muito tempo do ponto de vista da exposição pública. Muitos eleitores mais jovens não o conhecem“. Por outro lado, acrescenta-se, “a memória de Centeno é fresca e positiva”.
Em declarações ao Observador, Adalberto Campos Fernandes tocou a mesma tecla, dizendo ter “pena” por António José Seguro ter “estado tanto tempo ausente“. “Pode deixar ideia de que se desinteressou por aspetos cívicos. Dez anos é muito tempo. Há muitos portugueses que não conhecem o seu pensamento político”, provocou o antigo ministro da Saúde.
Já entre os apoiantes de Seguro, apontam-se fragilidades a Centeno — prova de que a marcação será cerrada durante largas semanas. “É um bom candidato, mas não é militante e não foi líder do PS”, regista-se. O raciocínio é simples: o apoio do PS será “determinante para um candidato ter hipóteses”. Seguro, pelo lastro que deixou no partido, rapidamente terá a máquina, os militantes e os barões do seu lado — ao contrário do não-militante Centeno.
Logo na manhã desta sexta-feira, em declarações ao Observador e numa primeira reação à entrevista, Francisco Assis fez questão de declarar o seu apoio a António José Seguro, dizendo ter sentido um grande “contentamento” no partido “com a sua manifestação de disponibilidade presidencial” e pressionando Pedro Nuno Santos a abençoar a candidatura. “[Espero que] a direção do PS o apoie”, afirmou Assis.
O argumento da militância ou não militância é desconsiderado entre aqueles que preferem ter o antigo ministro das Finanças nesta corrida. “Centeno nunca foi do partido mas é um dos nossos“, nota um socialista. “Maria de Belém candidatou-se contra Sampaio da Nóvoa quando tinha sido presidente do PS e não foi por aí que Nóvoa não teve muitos apoios do partido”, recorda outro elemento do PS, para quem “Centeno tem grande apreço por parte dos militantes”.
Mas António José Seguro é um antigo líder partidário e “não há nenhum Presidente que não tenha sido líder de um partido”, argumenta-se do lado do socialista que o prefere para Belém. Um dirigente distrital do PS aponta ao Observador que no terreno Seguro ainda é mais reconhecido. “É mais popular do que Centeno. Centeno não tem sequer experiência política de Seguro”, defende a mesma fonte ao Observador.
Um dos antigos apoiantes de António José Seguro aposta mesmo que, se o ex-líder socialista avançar de facto, terá o apoio imediato de grande parte do PS”. Este mesmo socialista considera que o próprio Pedro Nuno Santos tem tudo a ganhar tendo um candidato presidencial como Seguro. “Tem o rótulo de radical e para sobreviver à vida política tem de dar sinais de moderação, como já deu com Francisco Assis”, argumenta.
Já o antigo ministro de Saúde de António Guterres e José Sócrates, Correia de Campos, entre os dois, traçou “uma diferença enormíssima de desempenho político, de desempenho profissional, de capacidade e de preparação”. “Centeno é um homem doutorado por Harvard. Este simples facto faz calar uma roda de ministros das Finanças”, disse o socialista ao Observador, no programa Vichyssoise — António Correia de Campos esteve desde o início com António Costa na luta interna contra Seguro.