Os grandes consumidores intensivos de eletricidade, sobretudo grandes empresas industriais, queixam-se de que estão a ter de suportar um aumento anual de mais de nove milhões de euros da fatura de eletricidade porque têm de pagar o financiamento da tarifa social.
O custo da tarifa social passou a ser imputado às empresas comercializadoras de eletricidade, para além dos produtores, que na maioria dos casos opta por transferir essa fatura para os clientes finais. No caso das indústrias que fazem parte da associação de grandes consumidores, está em causa um consumo anual da ordem dos 5,3 TWh (terawatt/hora), o que “corresponde a um incremento na fatura de eletricidade da ordem dos 9,3 milhões de euros”, alerta a APIGCEE (Associação Portuguesa dos Industriais de Grandes Consumidores de Energia Elétrica). Este “impacto acumula com o atual elevado preço da energia elétrica e correspondentes custos regulados associados”.
Entre as associadas da APIGCEE está a Siderurgia Nacional do Seixal que anunciou recentemente paragens na sua produção por causa do elevado custo da eletricidade.
Esta posição dos grandes industriais foi transmitida no quadro da consulta pública promovida pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) sobre o modelo de financiamento da tarifa social que parece não agradar a ninguém. A associação que os representa reivindica que a ERSE limite esse eventual pass-through (transferência) dos encargos com a tarifa social aos clientes eletrointensivos “sob o risco de agravar um agravamento da competitividade da indústria nacional”.
Este é um tema sensível já que os grandes consumidores estão a aguardar há mais de um ano que a Comissão Europeia dê luz verde à proposta ainda do anterior Governo para permitir que estas indústrias tenham descontos na fatura em troca de micro-cortes do fornecimento para evitar rupturas no sistema elétrico. Os chamados regimes de interruptibilidade são usados em vários países europeus, como Espanha, para aliviar os encargos das empresas com a fatura e ao mesmo tempo reforçar a segurança de abastecimento.
O regulador descarta uma intervenção nestas opções comerciais das elétricas, uma vez que este encargo nada tem a ver com as tarifas que são da sua responsabilidade. E considera que não existe quadro legal que permita, como pedem as grandes consumidoras, diferenciar por tipo de cliente a transferência de custos com a tarifa social.
Elétricas podem atirar custo da tarifa social para clientes. ERSE diz que decisão cabe às empresas
A tomada de posição das grandes empresas é mais uma nota crítica do atual modelo de financiamento da tarifa social que foi aprovado pelo anterior Governo depois da Comissão Europeia ter dado razão a uma queixa da EDP que contestava o modelo original no qual só os centros produtores de eletricidade financiavam esse desconto para os consumidores de menores rendimentos.
A solução encontrada foi repartir o custo por mais agentes do sistema elétrico, envolvendo as empresas comercializadoras, uma alteração que abriu a porta à passagem dos custos para os clientes finais. Essa consequência mereceu alertas por parte da associação de defesa do consumidor e a ministro do Ambiente e Energia mostrou a intenção de mexer no modelo de financiamento. Maria de Graça Carvalho admitiu mesmo que o Orçamento do Estado pudesse assumir uma parte deste custo que é social, o que tem sido reivindicado pelo vários agentes do setor elétrico.
Na proposta de financiamento da social para 2025, a ERSE prevê que a medida vá custar menos 12 milhões de euros do que em 2024, essencialmente por causa da redução do número de beneficiários. Dos 124,2 milhões de euros de custos de financiamento estimados pelo regulador, a maior fatia de dois terços, o que corresponde a 78,1 milhões de euros. É esta fatia que potencialmente pode ser passada para os consumidores. Os produtores terão de suportar 43,6 milhões de euros.
A tarifa social abrange cerca de 800 mil famílias e é atribuída de forma automática a quem receba prestações da segurança social destinadas a pessoas de baixos rendimentos. Os consumidores abrangidos pagam a eletricidade com um desconto de 33,8% face ao preço bruto das tarifas reguladas.