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Jesus Cristo fez quiet quitting? – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Dez 24, 2024

Tenho observado jovens e descobri que o Natal está démodé. Corre o risco de, a breve trecho, deixar de ser relevante. As novas gerações já não ligam muito à época festiva. Abominam o consumismo, os enfeites, o empanturranço, as obrigações sociais e familiares, as convenções retrógradas. Amofinam-se por lhes imporem na agenda um período específico do ano dedicado exclusivamente ao amor, à alegria e à concórdia. Muitas vezes, o Natal atrapalha-lhes as férias de Natal.

Julgo que a grande culpa é de Jesus Cristo. O Messias já não tem o mesmo encanto para os millennials que teve durante os últimos milénios. Continua a ser um grande produto, mas o marketing está obsoleto. Não é forçoso que assim seja. A Igreja ainda vai a tempo de atalhar caminho e mudar a forma como promove a imagem de Nosso Senhor. Em vez de se focar na mensagem de amor ao próximo que o filho de Deus nos trouxe, se a Igreja pretende fomentar a identificação entre Cristo e a geração mais nova, fará melhor em apresentar Jesus como um jovem a braços com várias questões de saúde mental. Isso, sim, vai suscitar interesse.

Não é preciso inventar nada. Os indícios estão lá todos, prontos para serem lidos por qualquer influencer com um tik tok dedicado a transtornos mentais. Por exemplo, Jesus era uma criança irrequieta. É conhecido o episódio em que se perdeu dos seus pais, que voltavam para Nazaré, tendo ficado no templo, em Jerusalém, a conversar com os doutores. Distraíu-se e esqueceu-se de onde devia estar. É evidente que sofria de Transtorno de Défice de Atenção e Hiperactividade. Possivelmente, dado estar tanto tempo a falar com adultos sobre um tema que não era costume uma criança dominar, estaria também no espectro, com um pozinho de Asperger. Ao que tudo indica, não sofria de dislexia. Ufa.

Tinha também uma tendência para o auto-isolamento e depressão, atestada pelos 40 dias que passou sozinho no deserto. Jesus, sim, enfrentou literalmente os seus demónios. O facto de ter jejuado durante todo esse tempo leva a crer que pudesse sofrer de anorexia nervosa. Uma hipótese reforçada pela ocasião em que achou razoável alimentar milhares de pessoas com 5 pães e 2 peixes. Mais tarde, a ressurreição irá revelar também algumas questões de auto-imagem, com dificuldade em assumir o seu corpo.

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Quando, no Sermão da Montanha, Jesus insta os seus seguidores a oferecerem a outra face a quem lhes bate, demonstra um impulso para a auto-mutilação que, nos dias de hoje, mereceria um acompanhamento psicológico mais atento. Ter sido traído por um amigo próximo tê-lo-á deixado com medo de abandono, que só não teve mais sequelas emocionais porque passadas 24 horas estava morto.

Ainda que menos, também houve ocasiões de violência dirigida a outras pessoas. A expulsão dos vendilhões do templo tem todas as características de um evento de transtorno de stress pós-traumático. Alguma lembrança fez Jesus proceder daquela forma intempestiva. Que memória traumática poderá ter espoletado aquela reacção? Impossível adivinhar. O filho de Deus é tão velho como o tempo, o que não lhe falta é passado de onde surgirem recordações. Se eu tivesse de apostar, diria que, ao ver tanto comércio, Jesus teve um flashback do dia em que percebeu que, por fazer anos no dia de Natal, era sempre prejudicado no número de presentes que recebia, porque as pessoas lhe davam só uma prenda, em vez de duas. Deve ter ouvido “fica pelos anos e pelo Natal”, surtou e partiu aquilo tudo.

E essa é talvez a grande sombra na saúde mental de Jesus: a relação com o seu Pai. Se já é enorme a pressão sobre um filho de um pai bem sucedido, quanto mais quando esse pai é Deus Todo-Poderoso. Nem consigo imaginar a ansiedade de Cristo, preocupado em cumprir a missão que Deus lhe confiou. Que não era leve: salvar a humanidade não é propriamente a mesma coisa que salvar a lavandaria da família. As expectativas eram imensas, o medo de falhar acompanhou-o durante toda a vida. É provável que Jesus sofresse de síndrome do impostor, sentindo-se uma fraude apesar de toda a gente à sua volta o aclamar como génio. A pressão era de tal ordem que não é absurdo pensar que Jesus Cristo, ao deixar-se apanhar no Monte das Oliveiras, estivesse a praticar o agora tão na moda quiet quitting.

Se quer salvar o Natal, a Igreja deve apostar neste tipo de interpretação da mensagem de Cristo. Menos São Paulo, mais Eduardo Sá. No “amarás ao próximo como a ti mesmo”, pôr a enfâse no amor a si mesmo. Em vez de refeição, a consoada devia ser colóquio dedicado ao tema “Filhos de pais famosos – A saúde mental na Antiguidade”. Com um safe space, claro: uma sala especial de self care, com luz baixa, música calma, brinquedos de peluche, onde as pessoas se possam refugiar quando as palestras causam angústia e é preciso um tempo para recuperar emocionalmente da pressão do Natal. É onde eu pretendo fazer a minha sesta depois de me empanzinar de bacalhau.





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