Circula nas redes sociais uma publicação que alega que o Papa Francisco decidiu substituir o Natal deste ano por uma suposta “Festa da Paz” com o objetivo de “promover a paz mundial”.
A publicação fala de uma “medida sem precedentes” e até cita “diferentes meios de comunicação social”, que atribuem ao próprio Vaticano a decisão de substituir o Natal pela “Festa da Paz”. De acordo com o texto que circula nas redes sociais, a decisão “tem como objetivo centralizar os esforços da Igreja na promoção da paz mundial”.
Numa das versões da publicação que o Observador consultou, a mensagem é até acompanhada por uma captura de ecrã de uma “notícia” que aparenta ser do jornal argentino “El Cronista”, que dá conta de uma “decisão histórica” do Papa.
Outras versões da publicação incluem ainda a alegação de que a medida foi tomada para “não ofender os muçulmanos”. Surge também a acusação de um “veneno woke” a infetar o Vaticano e de que o Papa é “comunista”.
Trata-se, contudo, de uma publicação falsa. Vejamos os vários fatores que o demonstram.
Em primeiro lugar, não há registo desta suposta notícia do jornal El Cronista. Uma pesquisa no site daquele jornal pelas várias palavras que surgem nesta captura de ecrã não devolve qualquer resultado. No Google, acontece o mesmo. De acordo com a Euronews, que também noticiou a circulação desta informação falsa, o artigo do El Cronista terá mesmo existido — mas foi posteriormente retirado da internet e não há já qualquer registo dele.
Apesar de o artigo original não existir (ou já não existir), a verdade é que a informação se propagou e amplificou nas redes sociais — embora todas as publicações se limitem a replicar um conjunto limitado de frases e a mesma captura de ecrã daquele artigo, não apresentando qualquer fonte para a informação.
Contudo, não existe qualquer informação oficial da parte do Vaticano sobre esta alegada substituição do Natal por uma “Festa da Paz”. Pelo contrário, abundam na página oficial do Vaticano as informações oficiais sobre as celebrações de Natal presididas pelo Papa Francisco em Roma. Se lhe parece altamente improvável que o Vaticano viesse a substituir o Natal, um dos pontos altos do calendário litúrgico cristão e, provavelmente, a mais célebre das festividades cristãs, é por alguma razão: simplesmente, não é verdade.
Se precisar de provas mais concretas, basta consultar o site do Vaticano. Logo no dia 2 de dezembro, foi publicado o programa completo das celebrações pontifícias de Natal. As celebrações começaram no dia 24 de dezembro, às 19h, com a abertura da Porta Santa, que marca o arranque oficial do ano jubilar de 2025. No dia seguinte, dia de Natal, o Papa Francisco realizou pelas 12h a tradicional bênção Urbi et Orbi, típica do dia de Natal.
Além disso, no dia 1 de dezembro a Igreja Católica celebrou o início do Advento, o período de quatro semanas que antecede o Natal e em que a liturgia cristã adota um caráter de preparação para as festividades que assinalam o nascimento de Jesus Cristo. No site do Vaticano está também a intervenção do Papa Francisco na oração do Angelus desse primeiro domingo do Advento, com várias referências ao período do Advento e ao Natal que se aproxima.
Outro elemento mais prosaico contraria a informação da publicação: basta recorrer à transmissão em direto da Praça de São Pedro para testemunhar que já desde o início de dezembro se encontrava ali instalada a tradicional árvore de Natal do Vaticano, tendo sido também montado o presépio e outros elementos que habitualmente adornam a praça na quadra natalícia. Aliás, a árvore de Natal do Vaticano foi um tema polémico este ano, depois de um conjunto de ambientalistas ter promovido uma petição para apelar a que a árvore centenária destinada à Praça de São Pedro não fosse arrancada da floresta onde se encontrava.
Os arquivos digitais do Vaticano conservam, de facto, algumas referências dos papas ao Natal como a “festa da paz” — mas apenas no sentido de classificar o Natal como uma celebração da paz; não no sentido de criar uma nova festa com esse nome, destinada a substituir o Natal.
Conclusão
O Papa Francisco não substituiu o Natal por uma alegada “Festa da Paz” com o objetivo de promover a paz mundial ou de não ofender os muçulmanos, como alegam várias publicações. Não só não existe qualquer referência a essa informação em qualquer fonte oficial como a única referência que poderá ter existido num jornal (e que não citava qualquer fonte) já foi apagada. Ao mesmo tempo, o site do Vaticano publicou informações oficiais sobre as celebrações do Natal deste ano com o Papa Francisco — que corresponderam, como esperado, no geral às celebrações habituais que ocorrem todos os anos no Vaticano.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.