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AVC também atinge as crianças. Em Portugal, há cerca de 60 casos todos os anos (e faltam recursos na reabilitação) – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Mar 31, 2024

Apesar dos esforços, em cerca de 30% dos casos em crianças não é possível identificar os fatores que causaram, sublinha Rita Lopes da Silva. Nos restantes casos, e ao contrário dos adultos — em que os maus estilos de vida são os desencadeantes –, a causa é congénita.

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“Metade dos AVC são em grupos de risco, em crianças com cardiopatias congénitas, hemofilias, doenças trombóticas, anemia falciforme (mais frequente em descendentes de africanos), e que têm um risco aumentado”, explica a médica, que acompanha várias crianças nestas circunstâncias. Ao contrário dos adultos — em que o AVC isquémico é predominante –, nas crianças o mais comum é o AVC hemorrágico. “Nos adultos, 70 a 80% são isquémicos. Nas crianças, o AVC hemorrágico é tão frequente como o isquémico — 50%/50%“, adianta a neurologista.

Entre as crianças, o risco de ocorrência de um AVC não é igual em todas as fases. É, sim, bastante maior no primeiro ano de vida, período em que ocorrem 50% dos AVC. No entanto, nas crianças com anemia falciforme (uma doença hereditária que deforma os glóbulos vermelhos), o risco de AVC é maior dos 2 aos 10 anos. Já a mortalidade é maior em crianças mais pequenas ou nos casos de AVC hemorrágico, como acontece nas restantes faixas etárias. “O AVC isquémico pode deixar mais sequelas mas a mortalidade é mais baixa”, explica Rita Lopes da Silva.

Dois tipos de AVC


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AVC isquémico: ocorre quando uma determinada área cerebral não recebe o fluxo de sangue numa quantidade necessária, sendo que as células entram em sofrimento e começam a morrer se não houver tratamento — o que origina sequelas. A causa mais frequente é a vasculopatia e outras doenças que afetam as paredes dos vasos, seja por infeção ou inflamação, doenças do sangue, doenças genéticas. Outras causas são também doenças trombóticas, cardíacas, doenças metabólicas e genéticas.

AVC hemorrágico: ocorre por rutura de uma artéria ou veia, e que leva a uma hemorragia dentro do cérebro. As causas mais frequentes são malformações de artérias e veias, tumores, hemofilia, traumatismos.

Quantos aos sintomas, estes não diferem muito dos que se registam nos adultos. “A manifestação mais frequente em crianças também é a falta de força numa mão ou numa perna, tal como nos adultos“, diz a médica neuropediatria. Em crianças com menos de um ano, em que a manifestação dos sintomas é menos evidente, um sinal de alerta relevante é o bebé demonstrar a preferência pela utilização de uma das mãos com um ano de idade.

E se nos adultos a prevenção do AVC passa pela adoção de estilos de vida saudáveis, nas crianças — dada a origem congénita do problema –, será possível fazer algo para prevenir o pior? Embora as estratégias preventivas estejam mais limitadas, há exames que podem fazer a diferença. “[No caso dos AVC hemorrágicos], se soubermos que uma família tem um risco aumentado de aneurismas, podemos fazer exames que permitem detetar o aneurisma antes de romper (embora seja muito raro)”, realça Rita Lopes da Silva, sublinhando que, na maioria dos casos, a prevenção clínica não é possível em crianças.

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Se um chamados três F se verificar (desvio da face; falta de força num braço; dificuldade em falar), mesmo que seja numa criança, é importante acionar o 112, tal como se faria no caso de um adulto, sublinha a médica. Para além disso há outros sintomas distintivos possíveis — mas não tão distintivos –, como vómitos e convulsões. “Mas isto requer que a população (pais, professores, pediatras) saiba que existe AVC” nesta faixa etária, diz a especialista, sublinhando que é essencial combater o desconhecimento da sociedade em relação aos AVC nas crianças e sensibilizar pais e também profissionais de saúde para esta realidade. “Não pensamos que uma criança de quatro anos, que esteja a arrastar uma perna, tenha sofrido um AVC, mas pode”, reforça a neuropediatra. Tal como acontece com outras condições de saúde pouco frequentes, também os próprios profissionais de saúde podem não pensar num AVC pediátrico.

“Se não pensarmos no AVC, vamos ficar com a criança a fazer exames e o diagnóstico vai demorar mais. A nível internacional, há um atraso descrito, de até 24 horas, no diagnóstico de AVC isquémico, que está fora da janela de tratamento de fase aguda”, lamenta a médica.

Em fase aguda, os AVC nas crianças devem ser tratados nas primeiras seis horas (a janela de tratamento decisiva, sublinha Rita Lopes da Silva), com “medicamentos para desentupir a artéria e permitir a passagem de sangue, dissolvendo o trombo ou removendo-o”. A partir daí, o tratamento que é feito destina-se impedir a recorrência do AVC, uma situação comum — estima-se que a taxa de recorrência, isto é, de repetição ronde os 30% em crianças mais velhas e que seja superior nos dias imediatamente a seguir. “Quem sofre um AVC tem um risco de repetição aumentado nos dias seguintes, e por isso toma medicamentos antiagregantes, que impedem a agregação das plaquetas ou anticoagulantes”, explica a médica.



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