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A portuguesa mais velha de sempre viveu 115 anos. A história de Maria de Jesus, a mulher que resistiu ao tempo – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Ago 24, 2024


Ainda durante a juventude, um acidente fez com que Maria de Jesus ficasse cega de uma vista, algo que afetaria toda a sua vida — embora o bisneto garanta que, já centenária, a bisavó ainda era capaz de “enfiar uma linha numa agulha”.

Na idade adulta, Maria de Jesus testemunhou não só a Segunda Guerra Mundial como o surgimento do Estado Novo e a ascensão de Salazar. Viveu praticamente toda a sua vida adulta em ditadura — e foi também durante a ditadura que perdeu o marido, José dos Santos. Viúva aos 57 anos, Maria de Jesus era já mãe de seis filhos e nunca voltaria a casar.

Trabalhou sempre na agricultura e foi numa vida passada no mundo rural que teve não só os seis filhos, mas também os onze netos. Durante a ditadura, sofreu com a pobreza. “Ela ‘comeu o pão que o Diabo amassou’ numa altura em que ‘meia sardinha era o sustento de uma família à refeição’. Era o que havia, muito pouco ou nada, mas a minha mãe nunca virou a cara à luta e conseguiu criar os seis filhos que teve”, contou a filha, Maria Madalena, ao Diário de Notícias em 2008, numa reportagem a propósito do 115.º aniversário de Maria de Jesus. “O Portugal de então era muito pobre e lembro-me bem de que andávamos todos descalços, sem possibilidades de ir à escola, sem luz elétrica, sem nada.”

“Ela nunca gostou nem perdoou ao Salazar pelo sofrimento que causou ao povo”, sinalizou a filha de Maria de Jesus nessa reportagem.

O bisneto, Pedro Miguel Costa, também lembra a antipatia da bisavó relativamente a Salazar, embora a atitude fosse diferente em relação a Marcello Caetano. “Foi com Marcello Caetano que começou a ganhar a pensão e ficou muito contente”, recorda o jornalista. “Dizia que não gostava de Salazar, mas tinha simpatia por Marcello Caetano, por causa da pensão.” Em 1974, quando o Estado Novo caiu com a revolução do 25 de Abril, Maria de Jesus era já octogenária — mas ainda viveria mais 35 anos.

Maria de Jesus quando tinha 111 anos

DR

O jornalista conheceu a bisavó na casa da aldeia de Corujo onde Maria de Jesus viveria até ao fim dos seus dias. Nessa altura, a imprensa ainda não se tinha interessado pelo caso de Maria de Jesus, uma idosa como tantas outras. “Ela era uma avó, não tinha esse peso de ser maior de 100 anos”, lembra o bisneto, que conserva desses primeiros tempos memórias como a maioria das pessoas normais: era uma bisavó que adorava arroz doce, que cozinhava sonhos de abóbora, que tinha passado uma vida na agricultura e que gostava de passar tempo ao sol, sentada à porta de casa.

A transformação da bisavó numa figura quase mítica “foi acontecendo” com o tempo, lembra o bisneto. “A minha bisavó foi sempre aquela figura de referência de que nos lembrávamos, que acompanhámos numa fase de envelhecimento, aos 80, aos 90. Depois, chegando aos 100, começou a ter alguma piada”, recorda Pedro Miguel Costa. “Ela foi ficando entre nós e, a partir dos 100, começámos a vê-la de outra maneira. Acaba por se tornar uma figura maior à medida que vai resistindo ao tempo.”

A família de Pedro visitava Tomar com frequência. Além do Natal, que era sempre passado na companhia na bisavó, as idas à aldeia eram frequentes ao longo do ano. “Sempre nos habituámos a ter aquela figura como referência, uma figura que ia resistindo ao tempo e a tudo”, explica. Quando Maria de Jesus completou 100 anos, a família percebeu que tinha ali uma figura especial. “À medida que ia passando o tempo, havia muita atenção mediática. E isso mobilizava a família para a homenagear. Sempre que fazia anos íamos lá”, recorda o bisneto.





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