Para sustentar isso, foi atrás no seu passado como procuradora-geral, tentando provar que havia uma outra vida antes da campanha de 2020 — o subtexto era o de que talvez essa campanha tenha contido propostas mais à esquerda do que aquelas que verdadeiramente defende. “Os meus valores não mudaram”, voltou a dizer Kamala. “Defendo métricas para a emissão de gases poluentes. Defendo que se acuse judicialmente quem faz entrar armas e drogas ilegalmente através da nossa fronteira. Os meus valores não mudaram.”
É um exercício difícil. Em parte pelas posições que a própria assumiu durante a sua candidatura à presidência nas primárias democratas de 2020 (onde perdeu para Joe Biden); em parte pelo seu passado como congressista — em 2020, a associação GovTrack chegou mesmo a classificá-la como estando na ala “mais à esquerda” do partido no Congresso e como tendo sido das senadoras que menos fez propostas de lei bipartidárias.
Por outro lado, como já havia notado em 2020 um dos fundadores da própria associação, Josh Tauberer, à CNN, o passado de Kamala antes de ser senadora tinha uma inclinação mais moderada do que aquela que demonstrou de 2017 em diante. “Falta perceber que parte da sua carreira — as suas ações como procuradora e como procuradora-geral ou as suas propostas políticas no Congresso — se refletirá mais numa administração Biden”, disse à altura o analista, a propósito da escolha de Harris para a vice-presidência. Quatro anos depois, com a dificuldade de se fazer ouvir num cargo que é por natureza mais discreto, a dúvida aplica-se agora para uma futura Kamala Presidente.
Não há dúvidas, contudo, que Kamala candidata quer bater na tecla da moderação e da aproximação ao centro, para tentar colar Trump a um radicalismo deslocado do historial do Partido Republicano. Questionada sobre se equacionaria convidar um republicano para o seu governo, caso seja eleita, Harris não hesitou: “Sim, convidaria”, disse sem hesitar, mantendo o tom dado na Convenção, que contou com um discurso do congressista Adam Kizinger, conhecido pelas suas posições conservadoras, mas críticas de Trump.
In an exclusive interview with CNN’s Dana Bash, Democratic presidential nominee Kamala Harris said she would be open to putting a Republican in her cabinet. The full interview will air at 9 p.m. ET Thursday on CNN’s “The First Interview: Harris & Walz, A CNN Exclusive.”… pic.twitter.com/9nRzSA7RYb
— CNN Politics (@CNNPolitics) August 29, 2024
Quando se seguiu a pergunta “Quem?”, a candidata não foi tão longe, dizendo que isso seria por “o carro à frente dos bois”. Mas, uma vez mais, Kamal harris aproveitou para mostrar que não quer ser a candidata da divisão: “Quando se tomam as decisões mais importantes, creio que é importante ter à mesa pessoas que têm outras perspetivas e experiências diferentes. E creio que seria benéfico para o povo americano que um membro do meu governo fosse um republicano”.
O resto da entrevista contou com duas pequenas interveções do candidato a vice-presidente, Tim Walz, que esteve longe de conseguir brilhar. Limitou-se a expressar orgulho pelo filho, depois da reação desta na Convenção que se tornou viral; e a justificar algumas polémicas que o têm envolvido, nomeadamente as afirmações de que teria tido experiência de combate como membro da Guarda Nacional e que a sua família recorreu a fertilização in vitro.
Ao longo dos últimos dias, à medida que Walz se tornou uma figura mais reconhecida a nível nacional, os jornalistas descobriram que afinal não terá sido exatamente assim nos dois casos: Walz fez parte da Guarda Nacional durante 24 anos, mas não esteve em nenhum cenário de guerra; e passou por problemas de fertilidade com a mulher, mas a sua filha Hope não foi concebida através de fertilização in vitro, mas sim por inseminação intrauterina.