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uma celebração sem complexos do homem e do estadista que ganhou a Guerra Fria – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Out 10, 2024

O Rotten Tomatoes é um “site” que agrega críticas de profissionais do ofício e juízos de espectadores anónimos aos filmes que se estreiam nos EUA. No que respeita a Reagan, a fita biográfica sobre Ronald Reagan realizada por Sean McNamara, a falta de sintonia entre críticos e espectadores é colossal. Só 18% daqueles (em 67 críticas registadas) gostam da fita, enquanto que 98% dos segundos (em cerca de cinco mil participantes) aplaudem-na. Sabendo que a grande maioria da crítica americana é “liberal” (ou seja, pende para as esquerdas), estes números revelam que a azia daqueles em relação ao 40.º presidente dos EUA, e um dos melhores e mais populares da segunda metade do século XX, o homem que deu novo fôlego anímico e económico e prestígio internacional ao seu país, após o revés da Guerra do Vietname e a desastrosa presidência de Jimmy Carter, reavivou um Partido Republicano de rastos pós-escândalo Watergate e ganhou a Guerra Fria contra o comunismo, continua a ser enorme, ao contrário da opinião do cidadão comum.

Pese embora aos seus detratores, Reagan, com Dennis Quaid no papel principal, está a fazer números bastante simpáticos nas bilheteiras dos EUA, superando filmes mais caros e vistosos. E é uma celebração clara, assumida, despachada e regularmente tão bem-humorada como o biografado, da vida e da carreira política de Ronald Reagan, baseada no livro The Crusader: Ronald Reagan and the Fall of Communism, de Paul Kengor, e que, apesar de algumas (e inevitáveis) simplificações, digressões dramáticas e sínteses extremas, consegue trocá-las por miúdos e encaixá-las em quase duas horas e meia. Sobretudo por meio de breves episódios ilustrativos, desde a infância e a juventude até à Casa Branca, passando pelos tempos de Hollywood.

[Veja o trailer de “Reagan”:]

Além disso, Reagan é também um dos muito raros filmes que contraria o discurso de negação e a vulgata vitimista da esquerda sobre as movimentações dos comunistas em Hollywood nos anos 40 e 50. Vemos Ronald Reagan, na altura ainda não um republicano, mas um “democrata do New Deal”, como se definia, ativo no seu cargo de presidente do SAG, o sindicato dos atores americanos — que chegou a liderar numa longa e bem-sucedida greve contra os grandes estúdios em 1960 —, e enfrentando as infiltrações comunistas na indústria cinematográfica, destacando-se a figura do líder sindicalista Herbert Sorrell, que negando sempre ter pertencido ao Partido Comunista dos EUA, confessou na década de 50 ter sido financiado por este e “gasto com liberdade o dinheiro dos comunistas”.

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Abrindo com o atentado contra Reagan de 30 de março de 1981 em Washington, que não o matou por uma unha negra, o filme é narrado em “flashback” por um analista reformado do KGB, Viktor Petrovich (Jon Voight) que, sob vários ocupantes do Kremlin, estudou a vida de Ronald Reagan e seguiu e escrutinou toda a carreira política do “Cruzado”, o nome de código que lhe foi posto pelos russos, devido à sua sólida formação religiosa e ao seu fervor anticomunista. No seu apartamento de Moscovo, na atualidade, Petrovich conta a um jovem líder político russo em ascensão o papel decisivo de Reagan, da sua firme liderança política e da sua influência internacional, para a queda do Muro de Berlim, a derrota da URSS na Guerra Fria e o colapso do bloco comunista.

[Veja uma entrevista com Dennis Quaid e Penelope Ann Miller:]

Sean McNamara recorda que, quando Ronald Reagan foi eleito pela primeira vez Presidente dos EUA, em 1980, trazia já a experiência política de governador da Califórnia, e durante os anos difíceis da contracultura, da contestação estudantil radical e da atividade de organizações violentas como os Black Panthers. O filme frisa os dotes de comunicador aperfeiçoados por Reagan nos seus tempos de ator, mas também a sua espontaneidade empática, a simpatia natural e o seu desarmante sentido de humor. Aos quais associava uma total firmeza de convicções e uma tenacidade de ação na política interna e na cena internacional, sobretudo nas negociações com as sucessivas lideranças soviéticas sobre as armas nucleares, e que acabariam por levar à derrocada do Bloco de Leste, com a participação e apoio de outros líderes políticos e espirituais do Ocidente, como Margaret Thatcher, Helmut Kohl ou o Papa João Paulo II.

[Veja uma entrevista com o realizador Sean McNamara:]

O realizador não se esquiva a mostrar momentos mais difíceis e menos felizes da existência do seu biografado. É o caso do frustrante falhanço da carreira de ator, que o levaria, para sobreviver, a ter que fazer anúncios ridículos e a entrar em humilhantes espectáculos publicitários em Las Vegas, ou a derrota na primeira eleição para governador da Califórnia. E já na Casa Branca, o caso Irão-Contra, os efeitos das suas ideias económicas (as célebres “Reaganomics”) ou a reação atabalhoada do governo quando da eclosão da SIDA. Pelo filme passam ainda toda a agitação, todas as tensões, mas também todo o entusiasmo e otimismo desses inesquecíveis anos 80 (um dos momentos mais impressionantes de Reagan é a recriação do discurso em Berlim Oeste, frente à Porta de Brandenburgo e junto ao Muro da Vergonha, em que Ronald Reagan pede a Gorbachev para “derrubar este muro”).

[Veja uma sequência do filme:]

A escolha do ator para interpretar Ronald Reagan era fundamental para a credibilidade da sua personificação, o mesmo é dizer para o sucesso do filme. Dennis Quaid, bem coadjuvado por Penelope Ann Miller no papel de Nancy Reagan, sai-se de forma brilhante. Quaid evita uma “imitação” chapada ou laboriosa, captando e transmitindo, com segurança na subtileza, a entoação e os maneirismos, a personalidade bonómica, afirmativa e carismática, e a lhaneza sincera no ser e no estar, bem como os comportamentos, as palavras e os atos que ilustravam o patriotismo franco, a solidez das crenças  e a humanidade intrínseca de Ronald Reagan.

Abertamente, sem complexos nem pezinhos de lã, Reagan comemora e enaltece o homem e o estadista, e a sua obra, ao mesmo tempo que evoca um mundo e um tempo perigosos, mas também mais simples, mais transparentes e menos desconcertantes e sectários do que os de hoje. E uma década decisiva da história contemporânea, de que estamos cada vez mais saudosos, tal como dos grandes líderes políticos que no seu decorrer derrubaram o totalitarismo, à medida que nos vamos afastando dela.





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