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A equipa que faz da euforia a sua anti-depressão a caminho do título (a crónica do Gil Vicente-Sporting) – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Abr 12, 2024

Rúben Amorim é um treinador de rotinas. Os ciclos ou microciclos podem mudar consoante a existência de jogos durante a semana, a forma de preparação de cada encontro pelos tempos de recuperação também, mas tudo o que dependa de si faz-se da mesma maneira. Cria estabilidade, dá previsibilidade, confere ao longo do tempo sustentabilidade. Desde que chegou ao Sporting que este é um dos princípios fulcrais no mandamento do técnico, que admite apenas abdicar dessa posição quando vê, ouve ou sente algo que possa desviar depois o grupo da normalidade com que gosta de trabalhar e sente ser o melhor estado para os seus jogadores. Foi isso que aconteceu logo depois da vitória no dérbi frente ao Benfica com um golo de Geny Catamo a abrir os descontos, com o técnico a perceber que havia um contágio ao plantel quase por osmose da euforia que vinha das bancadas e a ir falar ao balneário antes de seguir para a zona de entrevistas rápidas.

“O sentimento de confiança está lá desde início. Obviamente com o desenrolar do Campeonato acreditamos cada vez mais. Os jogadores ficaram muito felizes com o resultado. Tem influência o minuto do golo e o estádio, porque fomos para dentro e ficaram ainda com as pessoas lá dentro. Esta semana trabalhámos bem, muito calmos e tranquilos. Sabemos a envolvência de tudo à volta desta equipa. As pessoas acreditam cada vez mais mas há muito a fazer, não senti euforia nenhuma. Senti que todos querem jogar, isso foi bom. Têm noção da dificuldade dos jogos que vêm aí. Não senti diferença para as outras semanas. Fiquei também um bocadinho desconfortável porque os jogadores ficaram muito felizes mas foi só isso. Os jogadores estão como sempre os vi: confiantes mas a pensar que os jogos são todos difíceis”, comentara Rúben Amorim.

Desta vez houve pouco ou nada sobre o futuro do técnico na envolvência do encontro em Barcelos frente ao Gil Vicente. Cumpriu a promessa, colocou o foco na vontade de ganhar o Campeonato, frisou apenas que não teve qualquer entrevista nem fez nenhum acordo com o Liverpool ou qualquer outro clube. Nem mesmo uma questão sobre os comentários do empresário de Viktor Gyökeres, que admitiu que o futuro de Amorim vai ser a chave para qualquer decisão do sueco, desviou esse rumo de apontar para os sete encontros ainda em falta na prova. Até a valorização no mercado do plantel em cerca de 100 milhões de euros foi feito à luz dessa conquista do título, tendo em conta o impacto que as conquistas coletivas têm nessas avaliações.

“Essa valorização encaixa no projeto de todos os treinadores, a ideia é melhorar a equipa e os jogadores. A valorização surge porque juntámos jogadores talentosos e uns ajudam os outros. Isso tem muito mais impacto do que o papel do treinador. De nada vale se não terminarmos a época com títulos, essa é a grande valorização: ganhar títulos e sermos competentes em momentos decisivos como este. Vejo isso com normalidade, são jogadores talentosos. Queria deixar também uma palavra ao scouting, conseguimos achar jogadores com grande talento e por um valor mais baixo. Não é algo que seja do treinador mas temos de vencer títulos para valorizar os jogadores”, reforçou Rúben Amorim antes do primeiro de dois jogos no Minho que, em caso de vitórias, seriam uma espécie de xeque quase mate antecipado à conquista do título.

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Primeira paragem: Barcelos. O Gil Vicente chegou a prometer muito mas acabou por entrar numa temporada demasiado irregular que levou à saída do técnico Vítor Campelos, substituído no jogo frente ao Sporting pelo interino Carlos Cunha antes da chegada de Tozé Marreco para a parte final da época. Se muitos viam nos galos a crise, Rúben Amorim, que não contava com os castigados Hjulmand e Nuno Santos, alertava para a oportunidade. “A preparação do jogo torna-se diferente. Há mais incerteza, não sabemos bem com o que contar. Vimos as caraterísticas individuais, depois fomos ver os Sub-23 do mister Cunha. Fizemos uma preparação normal entre essa incerteza mas muito focados no que temos de fazer. Se estivermos bem na nossa forma de jogar, vamos passar mais tempo com a bola e portanto focámos muito nisso”, explicara.

Não aconteceu assim. A crise do Gil Vicente foi mesmo crise, a oportunidade do Sporting foi mesmo uma oportunidade e o encontro deixou de ter história demasiado cedo. Houve a versão mais eficaz de Francisco Trincão, um Morita ao mais alto nível no meio-campo com Bragança ao lado e aquele Pedro Gonçalves que se faz importante a assistir como a marcar mas houve sobretudo uma equipa. Uma equipa que não teve medo de assumir a euforia que se viveu na chegada ao Estádio e que vinha das bancadas a abarrotar desde o início da partida para fazer disso a sua maior força contra qualquer tipo de fantasma ou depressão depois da vantagem de quatro pontos conseguida no dérbi. Tal como em 2021, neste caso com um triunfo com reviravolta nos minutos finais, foi em Barcelos que o Sporting fez o primeiro xeque ao título. Em Famalicão, em caso de nova vitória, será quase mate. E a simbiose que se vive entre equipa e adeptos explica muito disso.

O último treino trouxe mais uma dor de cabeça a Rúben Amorim, com Matheus Reis a não recuperar de uma lesão e a ficar fora da ficha de jogo. Por não querer retirar Geny Catamo do seu habitat natural, foi Ricardo Esgaio que ocupou a ala esquerda com Daniel Bragança a fazer dupla no meio-campo com Morita e Eduardo Quaresma e Diomande a darem “descanso” a Coates e St. Juste na defesa. O que mudou? Pelos jogadores, nada, pelas nuances táticas algumas coisas – sem bola, por exemplo, o Sporting definiu muitas vezes uma linha de quatro a defender, com Quaresma a ser quase um lateral direito para deixar Geny mais na frente a acompanhar os movimentos do lateral contrário. Depois, foi só ligar o modo on. O modo on de uma equipa que tem confiança para dar e vender, joga em piloto automático e tinha a vitória mais ou menos controlada num par de minutos para gáudio dos milhares de adeptos que “invadiram” Barcelos.

Quando as equipas começavam ainda a definir-se em termos estruturais e de encaixe, o Sporting adiantou-se no marcador: Pedro Gonçalves e Gyökeres combinaram pelo meio, Morita arrancou pelo corredor e fez o que raramente costuma fazer com um remate forte que bateu no poste e Francisco Trincão aproveitou os maus alívios e a tentativa errada de sair a jogar de Martim Neto para rematar de pé direito para o 1-0 (7′). Havia a primeira explosão no Estádio Cidade de Barcelos que quase acabava em invasão pacífica de alguns adeptos mas que teria prolongamento pouco depois, com Francisco Trincão e Geny Catamo a trabalharem um canto à direita para o cruzamento de Pedro Gonçalves e Diomande a desviar de cabeça ao segundo poste para o 2-0 (11′). Tudo o que não podia acontecer ao Gil Vicente, a tentar estabilizar em termos emocionais após a saída do treinador, aconteceu ainda pior. Tudo o que devia acontecer ao Sporting, numa fase de confiança onde tudo parece correr bem, saiu melhor do que a encomenda. Voltava o ambiente de euforia às bancadas.

Não iria ficar por aí até ao intervalo, numa das primeiras partes mais consistentes do Sporting esta época que coincidiu com a pior do Gil Vicente ao longo de toda a temporada. Aliás, não fosse uma tentativa muito por cima de Pedro Tiba e o jogo tinha sido todo no meio-campo e na baliza dos minhotos, com Francisco Trincão (19′) e Pedro Gonçalves (25′) a darem o aviso daquilo que aconteceria de seguida, com Daniel Bragança a roubar uma bola a meio do meio-campo contrário a Mory Gbane, a conduzir até à assistência para Francisco Trincão e a festejar o bis do esquerdo sozinho na área (31′). Os visitados estavam a ser “atropelados” e não tinham qualquer poder de reação, colocando-se quase a jeito para o 4-0 ainda antes do intervalo, com Inácio a lançar Pedro Gonçalves pela esquerda, Gyökeres a desviar de cabeça à trave mas a bola a bater ainda na cabeça de Andrew, passando mesmo a linha num lance em que o avançado sueco nem festejou (38′).

Entre algum mérito pelas três substituições feitas por Carlos Cunha ao intervalo, com as entradas de Félix Correia, Fujimoto e Alipour, e algum demérito do Sporting por não ter conseguido entrar com a mesma força que tinha mostrado no arranque da partida, o encontro ganhou contornos diferentes no segundo tempo. A abrir ainda houve duas ameaças de Gyökeres, que parecia mesmo apostado em marcar também em Barcelos, mas o Gil Vicente conseguiu repartir mais os momentos diante de um conjunto verde e branco também a gerir tendo em conta a deslocação a Famalicão na próxima terça-feira. Assim, e já com Coates e Marcus Edwards em campo, o primeiro lance de algum perigo até acabou por pertencer aos minhotos, com Depú a conseguir desviar de cabeça após canto da esquerda para a primeira defesa de Franco Israel (63′).

Havia jogo mas sem ser propriamente jogo. Os adeptos verde e brancos continuavam a fazer a festa entre um pequeno incêndio que obrigou a que uma bancada fosse “limpa” durante alguns minutos, os jogadores verde e brancos geriam a vantagem da melhor forma com substituições que apontavam também para os elementos com maior desgaste. Todos menos Gyökeres. Aliás, a última meia hora resumiu-se à luta do avançado sueco para chegar também ao golo, tendo ainda mais um remate às malhas laterais entre outras tentativas para o 5-0 que acabou por não aparecer. A vontade era tanta que, quando Manuel Oliveira deu apenas dois minutos de descontos, o número 9 começou a protestar. Também assim se explicam os sete pontos de avanço…





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