Há alguns anos atrás os artigos de opinião dos jornais estavam reservados para “os colunistas”. Esta elite de “fazedores de opinião” estava praticamente cristalizada. Para além das cartas dos leitores — muito limitadas em número de caracteres — era quase impossível para um cidadão comum conseguir que um texto escrito por si fosse publicado num jornal nacional.
Com o surgimento da internet, nomeadamente com a grande difusão dos blogs, principalmente a partir de 2000, percebeu-se que havia uma parte da sociedade que desejava ser escutada. Diversas pessoas tiveram a oportunidade de formular opinião sobre vários assuntos. Algumas delas começaram a ter uma enorme influência, designadamente através do comentário político. Os meios de comunicação tradicionais não ficaram indiferentes, e com frequência acompanhavam e citavam a opinião expressa nalguns blogs.
Percebeu-se que haviam muitas pessoas, para além da casta habitual dos colunistas, que escreviam bem e tinham um pensamento político que valia a pena acompanhar. Podiam-se ler textos com conteúdo interessante e assistir a reações/discussões acesas dos leitores na caixa de comentários. Para muitos, tornou-se um hábito diário acompanhar as publicações de vários de blogs, individuais e coletivos, com grande qualidade.
A decadência dos blogs aconteceu gradualmente durante a década de 2010, quando redes sociais como Facebook, Twitter e Instagram se tornaram os canais principais de comunicação. As redes sociais facilitaram o compartilhamento rápido e instantâneo de informação, reduzindo a necessidade de manter um blog constantemente com novos conteúdos. A evolução do marketing digital, o algoritmo das redes sociais que influencia a forma como consumimos conteúdos, com destaque para o conteúdo visual e as interações rápidas, contribuíram para o declínio do formato de blog tradicional.
Mas, os jornais não ficaram indiferentes ao fenómeno de tornar mais acessível a participação da sociedade através de artigos de opinião. A transição da publicação em papel para o jornal online facilitou a publicação de mais artigos de opinião e sem grandes limitações de extensão de caracteres. O Observador foi um dos primeiros jornais online a perceber que ganharia em dar voz aos seus leitores. Com efeito, têm sido publicados vários artigos de opinião, excelentes na forma e no conteúdo, escritos por pessoas quase desconhecidas.
Entretanto, o número de artigos de opinião não para de crescer. Inevitavelmente com o aumento da quantidade perde-se qualidade e, com o tempo, surge o fenómeno da saturação. Do meu ponto de vista, as pessoas têm cada vez menos paciência para textos longos, cujo conteúdo se limita a interesses específicos e que frequentemente não oferece uma visão nova e substancial sobre o tema. Com a maior pluralidade de visões corre-se o risco de termos opiniões mais superficiais e polarizadas. Em síntese, a palavra escrita nos artigos de opinião está a perder valor e impacto.
Em contraste, os podcasts com uma duração cada vez maior, muitas vezes sob a forma de entrevista, estão a ter um enorme sucesso na internet. E porquê? As pessoas estão cansadas pela enorme velocidade e quantidade em que é apresentada a informação e a opinião nas formas tradicionais. Dá-se cada vez mais valor a uma boa conversa civilizada, em contraste com os debates nos quais as pessoas estão constantemente a interromper-se com uma agressividade irracional. A empatia que se sente, entre os participantes, em muitos podcasts exerce um poder quase ansiolítico, permitindo-nos refletir com mais calma nos conteúdos. O estilo de conversa mais intimista cria a sensação de a opinião ter um carácter mais genuíno e verdadeiro. No final, mesmo após mais de uma hora de escuta, ficamos com a impressão de que valeu a pena o tempo dedicado a ouvir.
Julgo que estamos a assistir a uma nova mudança na forma de fazer opinião. Há um desejo de desacelerar a agitação do dia a dia, de sentir que se tem tempo para refletir. O diálogo empático entre duas ou mais pessoas que se respeitam e sabem ouvir-se mutuamente tem um poder comunicacional imenso.
A canção Video Killed the Radio Star lançada pela banda britânica The Buggles teve um enorme sucesso nos anos 80, coincidindo com o aparecimento da MTV. Essa profecia não se concretizou, pois os videoclipes não mataram a rádio. Da mesma forma, acredito que os artigos de opinião não vão sucumbir às novas formas de exprimir opinião, mas penso que estão a perder cada vez mais a sua influência e relevância.