O antigo ministro da Agricultura Arlindo Cunha apontou a reestruturação e o redimensionamento das cooperativas agrícolas como uma das medidas que o novo Governo deve tomar, para que possam ter “um trabalho mais proativo” na comercialização dos produtos.
“Temos de fazer alguma coisa de fundamental no que respeita a melhorar as condições de comercialização da produção agrícola”, disse Arlindo Cunha à agência Lusa.
O também antigo secretário de Estado da Agricultura lembrou que “as cooperativas estão em todo o território” português, mas “a maior parte delas não vendem produtos dos agricultores“.
“Acho que era muito importante fazer um trabalho com elas, mediante apoios e condições, para terem um trabalho mais proativo na comercialização dos produtos”, defendeu Arlindo Cunha, acrescentando que isso “implicaria qualificação de recursos, contratação de profissionais especializados e fazer alguns investimentos”.
No seu entender, nalguns casos, implicaria programas de concentração ou fusão de cooperativas, porque “os ganhos de escala são uma das dimensões importantes” deste trabalho. “Em Portugal, temos boas cooperativas, algumas funcionam muito bem. Até temos um caso exemplar, que é o setor do leite, em que as cooperativas criaram uma sociedade anónima com capitais exclusivamente delas, que faz toda a integração vertical do produto leite, que é a Lactogal”, frisou.
Este caso de sucesso “assegura desde a produção até à venda final e transformação” e “tem cerca de 60% do mercado português do leite”, acrescentou. Segundo Arlindo Cunha, nos grandes países da União Europeia onde a agricultura é muito forte, como Holanda, Dinamarca, França, Alemanha e Espanha, “as cooperativas são o setor que mais pesa na comercialização final dos produtos agrícolas”, funcionando “quase como empresas privadas”.
“Cá temos situações muito desiguais. Temos a do leite e temos alguma organização razoável no setor dos vinhos também. Mas depois, em muitos outros setores, na maior parte deles, não temos”, lamentou o também presidente da Comissão Vitivinícola Regional do Dão.
Neste âmbito, defendeu “uma análise sobre o papel que as cooperativas podem desempenhar a nível da comercialização no território” e que seja feito “um esforço no sentido de as ajudar a ganharem escala, recrutarem recursos humanos e criarem condições para poderem dar um passo mais à frente em matéria de comercialização”.
Outra aposta que Arlindo Cunha defende é nos mercados locais e nas cadeias curtas de abastecimento, para que produtos como legumes e frutas não tenham de chegar a Portugal oriundos do outro lado do mundo.
“Nós temos uma estrutura de distribuição muito baseada em grandes entidades internacionais e isso propicia a globalização da comercialização, mas as coisas estão a mudar”, considerou, lembrando o que se passou durante a pandemia de covid-19, “em que as cadeias de abastecimento foram cortadas”, e também os conflitos na Europa.
Por outro lado, “hoje em dia uma das questões de topo da agenda política é a descarbonização e cumprir as metas do Acordo de Paris” e, para isso, é muito importante que os produtos possam ser produzidos e consumidos a nível local e regional, acrescentou.
Para Arlindo Cunha, “há um trabalho muito grande a fazer em termos de organização dessa cadeia local de produção versus comercialização local e regional”, porque, ainda que os municípios estejam a trabalhar nisso, “merecia uma abordagem nacional mais abrangente”.
Outro assunto que o preocupa é o facto de, em Portugal, menos de 4% dos agricultores terem menos de 40 anos, o que considera “muito preocupante”. “Todos os governos dizem que é prioritário apoiar os jovens, mas o que é o facto é que há 24 anos, em 2000, tínhamos 9,5% de jovens agricultores, com menos de 40 anos, e hoje estamos em 3,7/ 3,8%”, lamentou.
Arlindo Cunha defendeu ainda a necessidade de se fazer “um exercício de simplificação da burocracia” na aplicação do Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC). “Há muita burocracia na forma como são analisados e decididos os projetos de investimento que são candidatos ou nas medidas ambientais que hoje são uma parte importante da política agrícola. Os chamados eco regimes, por exemplo, são complicadíssimos, portanto, tem de haver uma simplificação nessa matéria”, considerou.