Além do Donbass, as tropas russas estão focadas noutro ponto quente da guerra: Kursk. Após a ofensiva fulminante em agosto de 2024, a Ucrânia tem resistido e ainda controla partes daquela região russa na fronteira perto de Sumy, ainda que com custos. A Rússia não esconde o desagrado com a ocupação ucraniana: não só pelas populações que vivem na região e que tiveram de ser deslocadas, como também por dar a Kiev alguma vantagem em eventuais negociações. O Kremlin quer retirar esse trunfo do adversário e terá, segundo indicou o Presidente Volodymyr Zelensky, 50 mil homens prontos para expulsar os ucranianos, mas o apoio recente norte-americano pode tornar a tarefa mais difícil e deixado a situação “muito desafiante”.
Atravessando dificuldades no campo de batalha, a Ucrânia não quer dar parte fraca e mantém a esperança de que será capaz de terminar com a guerra de acordo com os seus termos, e os dos aliados — como a administração Biden ou a União Europeia (UE) — têm insistido que aconteça. Para Kiev, uma vitória seria evitar quaisquer cedências territoriais à Rússia, regressando às fronteiras estabelecidas após o fim da União Soviética. Mesmo que isso pareça cada vez mais difícil e que exista quem já admita que a paz não aconteça sem cedências.
Desde o dia 24 de fevereiro de 2022, a guerra já passou por várias fases. No início do conflito, as tropas russas avançaram sem grande oposição em territórios ucranianos. Cerca de seis meses depois, a Ucrânia assumiu a ofensiva, recuperando a totalidade da província de Kharkiv, no norte, e reconquistando a margem direita do rio Dniepre, no sul, em Kherson. No leste, as forças de Kiev também registaram alguns sucessos, mas a Rússia foi fortalecendo-se defensivamente a partir do inverno de 2023.
Na primavera do ano passado, os ucranianos tentaram ainda levar a cabo uma contraofensiva cujo objetivo passava por recuperar os restantes territórios, mas nunca teve sucesso — os ganhos foram marginais. O conflito parecia arrastar-se num impasse durante meses, até que Moscovo colocou-se na ofensiva, principalmente durante a primavera de 2024, uma tendência que se mantém até agora.
Nos quase mil dias que tem o conflito (esse marco será alcançado na terça-feira, dia 19 de novembro), a conquista mais visível da Rússia consiste no controlo quase total que mantém de Lugansk. A Ucrânia ainda mantém uma parcela da região, mas bastante reduzida. Em declarações à Newsweek, Angelica Evans, especialista do think tank norte-americano Instituto para a Guerra (ISW, sigla em inglês), estimava, a 3 de outubro de 2024, que as tropas de Moscovo ocupassem 98,8% desta província que integra o Donbass. Os combates em Lugansk estão centrados na linha Svatove-Kreminna, perto da fronteira com a província de Kharkiv.
Fazendo fronteira a oeste com Lugansk, a província de Kharkiv, que esteve ocupada pelos russos nos primeiros meses do conflito até ser libertada pelos ucranianos, continua a ser palco de intensos combates, o que mostra que a Rússia ainda não desistiu de conquistar esta região em que controla apenas algumas aldeias. Ainda esta quarta-feira, a Ucrânia assegurou ter repelido um ataque em redor da cidade de Kupiansk. “Entraram parcialmente nos subúrbios, na zona industrial e foram expulsos pelas nossas tropas. Foram ações com grupos de assalto que usavam veículos blindados e tentaram trazer a infantaria“, contou à Reuters o chefe da administração militar da cidade, Andriy Besedin.
Mais a sul, em Donetsk, na outra província que integra o Donbass, ao fim de mil dias, a situação é menos positiva para a Rússia em comparação com Lugansk. As tropas leiais ao Kremlin estão longe de controlar a totalidade da província, existindo várias frentes ativas: Siversk, Chasiv Yar, Toresk, Pokrovsk, Kurakhove, os subúrbios de Vuhledar (uma cidade já conquistada pela Rússia) e algumas localidades que estão na fronteira entre o Donetsk e Zaporíjia.
Segundo Julian G. Waller, é perto de Kurakhove e Pokrovsk que a situação está mais complicada para a Ucrânia no Donetsk. Em redor das duas cidades, as tropas russas estão a conseguir fazer avanços significativos. “As táticas russas continuam a evoluir, tal como as posições defensivas ucranianas procuram contra-atacar eficazmente”, destaca o professor universitário, indicando que se tem visto, no campo de batalha, “menos assaltos frontais” e mais “operações” da Rússia que visam cercar as tropas da Ucrânia. “Existe uma considerável heterogeneidade nas abordagens, tirando partido de uma linha da frente dinâmica”, acrescenta.
Em Zaporíjia e em Kherson, duas províncias mais a sul e em que também foi realizado um referendo por Moscovo — contestado pela comunidade internacional — para as incorporar na Federação Russa, a situação está mais estável, se bem que continue a haver combates a um ritmo diário. De acordo com o relatório desta sexta-feira do Instituto para a Guerra, a Rússia está a concentrar a ofensiva na cidade de Huliaipole, em Zaporíjia, enquanto em Kherson continuam os combates junto do rio Dnieper.
Fora do território ucraniano, no sul da Rússia, prossegue a ofensiva na província russa de Kursk. As tropas russas já conseguiram recuperar algum território perdido desde agosto e estão a fazer avanços nos últimos dias, para alcançarem o derradeiro objetivo: terminar de vez com a ocupação ucraniana na região. Para isso, estarão a levar a cabo uma forte ofensiva com 50 mil homens, existindo a possibilidade de a qualquer momento os militares norte-coreanos entrarem em ação.