A deputada timorense Nurima Alkatiri defendeu que o combate à violência contra as mulheres em Timor-Leste é uma prioridade e deve ser feito com foco, salientando que a chave para resolver a normalização daquele flagelo é a educação.
“As famílias timorenses vivem num círculo de violência já há bastante tempo, que ainda não foi quebrado e a violência tem sido cada vez mais normalizada como parte da dinâmica da sociedade timorense, infelizmente, como resposta, como reação, a tudo o que não nos agrada”, afirmou à Lusa a deputada da Frente Revolucionário do Timor-Leste Independente (Fretilin, na oposição).
Dados da Comissão para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres, da ONU, indicam que em Timor-Leste mais de metade das mulheres com idades compreendidas entre os 15 e os 49 anos sofreram violência física ou sexual de um parceiro do sexo masculino.
A deputada, que pertence também à Comissão de Saúde, Segurança Social e Igualdade de Género do parlamento timorense, afirmou que a prevalência da violência contra as mulheres, “uma grande maioria dentro da família”, é “assustador”, porque os dados não incluem “a violência e os abusos que as crianças sofrem em Timor-Leste”.
“Acho que há uma falta de foco, de dar prioridade a um problema que é muito mais de raiz do que apenas de políticas. Acho que é um problema que temos de resolver, aceitando que é algo que não vamos resolver do dia para a noite, mas que é necessário começarmos a trabalhar nisso”, defendeu Nurima Alkatiri.
Segundo a deputada, uma criança que cresce vítima de violência “física e psicológica” ou a ver a mãe ser vítima de violência, “cresce para ser alguém que comete violência ou para ser alguém vítima de violência”.
Questionada sobre as razões pela quais aquela violência prevalece, Nurima Alkatiri afirmou que está “relacionada com a mentalidade” que os timorenses têm de que a “violência faz parte do dia a dia, que é aceitável”.
“Temos de quebrar isso e para quebrar isso não é só com a disseminação da lei contra a violência doméstica, é uma questão de educar com foco na questão da mudança de mentalidade da sociedade”, afirmou.
Em Timor-Leste, segundo a também antiga consultora para as questões de igualdade de género, há uma “necessidade muito grande” de se aprender a comunicar de forma mais “saudável, mais educada, mais respeitosa, sem ofensas”.
“Há uma necessidade muito grande de voltarmos a pensar na parte da educação, que é uma preocupação, porque vemos que o sistema formal de educação em si está com dificuldades e desafios muito grandes e não tem uma perspetiva forte nestes aspetos”, disse.
Mas, para a deputada, a mudança deve começar nos líderes, que são “vistos como exemplos para os mais jovens e para todas as gerações”.
“Se temos líderes que batem nas mulheres, se temos líderes que cometem assédio sexual ou mesmo abuso sexual contra mulheres ou contra outros indivíduos e estão impunes e o conhecimento é público, principalmente numa sociedade tão pequena como Timor-Leste, claramente ajuda à normalização destes assuntos na sociedade e as pessoas param de questionar e, mesmo que não gostem, começam a aceitar como parte do dia a dia”, afirmou Nurima Alkatiri.
Para a deputada, a questão não é a falta de legislação e de regulamentos, mas a falta de implementação e também de uma educação das pessoas para perceberem as razões da sua existência.
“A chave é a educação, educando as novas gerações sobre os papéis de cada género, a importância da igualdade, a importância de dar o valor a todos os seres humanos e isso é educação e infelizmente nós estamos a falhar nisso”, considerou.