Estava sozinho, num hotel, quando teve os primeiros sintomas: um formigueiro nas mãos e nos pés, o coração a bater muito rápido, a aflição de quem tem quase a certeza de que está a morrer. Só melhorou com um ansiolítico, mas quis fazer todos os exames físicos para ter a certeza de que não era um problema cardíaco.
Ator, rosto conhecido no Brasil e em Portugal, muito por causa das novelas, Marcelo Serrado fez terapia, ganhou novos hábitos de vida e esteve medicado para controlar as crises de pânico e ansiedade. Quando sentiu que já estava bem, parou de tomar os medicamentos, de um dia para o outro. “Um erro”, diz. Há três meses, acabado de entrar num avião para uma viagem de nove horas, aconteceu tudo outra vez.
Nesta entrevista inserida na série “Labirinto — Conversas sobre Saúde Mental“, uma iniciativa do Observador e da FLAD, agora incluída no projeto Mental, conta que só depois do primeiro episódio percebeu que há muitas pessoas com o mesmo problema, apesar de alguns acharem que é só “frescura”. Na conversa, gravada na Biblioteca de Alcântara – José Dias Coelho, explica que tenta olhar para a ansiedade e o pânico como uma espécie de entidade, com quem pode dialogar: “A crise vem, eu sei que ela está vindo, converso com ela: ‘Espera, fica aí do teu lado. Não vem aqui não’.”
Um vídeo que partilhou nas redes sociais e um programa do “Fantástico” acabaram por transformá-lo num orador sobre o tema. E percebeu que partilhar a sua história com outros também o ajuda. Como aqui em Lisboa, onde o ator esteve com o espectáculo “SINATRA A WANDO e outras Bossas”: “Estava andando pela rua e uma senhora disse-me: ‘Posso te dar um abraço? E dizer que você não está sozinho’.”
[Veja aqui a entrevista completa a Marcelo Serrado]
Consegue recordar-se do momento em que viu os primeiros sinais de que alguma coisa não estava bem consigo?
Consigo. 2020, estava num hotel no Rio de Janeiro e comecei a sentir… é uma sensação física, não é? No meu caso, começou com os pés formigando, as mãos formigando, o coração acelerou e, como não sabia o que era, achei que ia ter um enfarte, alguma coisa do coração. E isso começou a piorar. Porque, na verdade, a mente vai-te traindo, vai colocando só coisas ruins, pensamentos ruins.
Pensou: isto é um enfarte, vou morrer.
Vou morrer, ninguém vai me ajudar, vou ficar sozinho.
Estava sozinho?
Estava sozinho.
E estava a fazer alguma coisa, estava enervado, preocupado com alguma coisa?
Estava trabalhando muito, estava preocupado, talvez, com algumas coisas. Mas liguei para a minha mulher e ela não atendia, porque ela estava em casa, eu estava trabalhando. E consegui ligar para os parentes da minha mulher, para o pai dela e para a mãe, a minha sogra.
No meio dessa crise?
Sim, no meio dessa crise, duas da manhã, mais ou menos. Só que, nesse tempo, do local em que eu estava até a casa deles, a cabeça foi meio zonza, meio desfalecendo. Cheguei lá, ela olhou para mim e falou: “Você está branco.” Eu pensei: “Piorei.” Porque quando a pessoa fala “você está branco” é pior. Ela ligou para o médico — eu falei “liga para o meu médico porque não estou bem” — e o médico percebeu pelos sintomas que era alguma coisa ligada à mente, não ao físico.
Só por essa conversa pelo telefone?
Sim. Mandou tomar um ansiolítico, deu-me um remédio e eu apaguei. No dia seguinte, fui descobrir o que era. Falei: “Tem alguma coisa errada comigo” e fiz todos os exames. Nada. Zero corpo, tudo bem.