Quando este texto for publicado estaremos em plena época natalícia. Os jornais e as televisões poderiam estar nestes dias a transmitir as luzes que iluminam as noites das cidades, o frenesim nas áreas comerciais ou as mensagens de solidariedade e compreensão que se vão ouvindo um pouco por todo o mundo. Não estão. Chega ao fim o segundo mandato de Marcelo Rebelo de Sousa, que termina uma década cheia de luzes e de sombras, e que se arrasta tristemente e sem grandeza. Até que o distanciamento nos dê outra visão do que foi o nosso passado político recente, temos de nos virar decisivamente para o futuro.
Chegou a corrida à presidência da república. Um grupo de “protocandidatos” acotovela-se para chegar à primeira fila das fotografias da praxe, de preferência nas primeiras páginas e em grande formato. Sucedem-se as avaliações dos fazedores de opinião, às vezes de forma independente, outras de modo mais condicionado. Fala-se todos os dias dos candidatos, das suas virtudes e defeitos. Deixem-me falar dos que o não são.
O espírito da época leva-me a começar por evocar o mais conhecido dos não candidatos, alguém que se não põe em “bicos de pés” para chegar aos microfones, que dirigiu o país num período muito difícil, tomou atitudes corajosas, mas por vezes imprudentes. Disse o que devia e o que poderia ter evitado. Não facilitou e errou muitas vezes. Foi considerado impiedoso sendo alguém cheio de humanidade. Não preciso de o nomear porque todos sabem a quem me refiro. À medida que o tempo marca o seu compasso, as decisões infelizes perder-se-ão da memória, e ficará o espírito de serviço, a dedicação ao país, o desprendimento e o sentido do dever.
Ao longo da minha vida profissional trabalhei com três mulheres muito envolvidas na política e com projeção nacional, de três famílias políticas diferentes. Todas são “não candidatas”. Cruzei-me com elas no conselho geral da universidade de Lisboa, ou nos dois ministérios com a tutela do Mar. São competentes, lutadoras, e nunca desistem daquilo em que acreditam. Fizeram a sua vida política e profissional com imenso valor, mas, por uma ou outra razão estão fora da corrida. Como se desistissem de uma luta a que naturalmente não faltariam: não tivemos uma única Presidente, passado mais de um século sobre a fundação da República e qualquer delas estaria bem nesse lugar.
Não vislumbro também ninguém verdadeiramente enraizado no setor económico, com uma experiência empresarial, que nos transmitisse a esperança de que podemos mesmo melhorar de vida e de que existem dirigentes económicos dispostos a um esforço patriótico. Um candidato que não esteja tão mergulhado na politiquice diária e na espuma dos dias. Que pense o país a prazo e de forma estratégica, não se deixando enredar na intriga palaciana que se esgota em si própria e nada produz. Já tivemos no passado candidatos com este perfil, mas partidos e votantes nunca os perceberam como, a meu ver, deveriam ter feito.
Tenho uma pequeníssima esperança de que ainda poderemos ter uma prenda, que bem se ajustaria à época natalícia, mas, se este quadro não mudar, os protocandidatos sairão do seu casulo, e transformar-se-ão em candidatos de corpo inteiro. Os seus nomes decorarão os boletins de voto e, por convicção ou por falta de melhor alternativa, lá terão os portugueses de escolher.
Para já existe um vencedor virtual tal como nas provas desportivas. Parte na “pole position” porque tem uma postura e qualidades em que muitos se revêm, e tem um grande sentido de oportunidade. Não posso deixar de me divertir com a comparação com o Príncipe Perfeito que só pode ser uma blague preparada por alguém que não se mede e que não ajuda o candidato. A esta brincadeira apetece-me responder com outra: “eu também sou o Dom João II”, incitado pela memória terna dos inúmeros Napoleões que, pelo menos na minha imaginação, sempre percorreram os corredores dos manicómios em que por vezes este país se parece transformar.
Independentemente da campanha que se aproxima e da escolha final dos portugueses, acredito que o novo Presidente da República se esforçará por estar à altura da missão que lhe for confiada.
E, finalmente, sendo esta a última crónica do ano, desejo a todos um feliz Natal e um excelente ano de 2025. Aos que me leem, aos que o não fazem, aos que concordam e aos que discordam, criticam ou corrigem. E em particular aos amigos a quem muitas vezes pedi ajuda para evitar escrever tolices, e à equipa do Observador que acolhe sempre com generosidade estas crónicas escritas com boa vontade e algum esforço, e que de forma ligeira tentam falar de assuntos sérios.