A misteriosa beluga macho que foi detetada nos mares escandinavos com um arnês onde se lia “Equipamento São Petersburgo” não seria usada como espiã mas, sim, como “baleia de guarda”. É esta a tese de um novo documentário, que vai ser transmitido pela BBC na quarta-feira e que revela novas informações sobre o caso que há vários anos está no centro de um enorme mistério.
A baleia ficou conhecida pelo nome Hvaldimir, um trocadilho com Hval (norueguês para “baleia”) e Vladimir, o primeiro nome do Presidente russo, Vladimir Putin. O animal, que foi encontrado morto há poucas semanas, foi detetado pela primeira vez na Noruega em 2019 e, em 2023, voltou a ser visto na costa sueca. Desde o início que se suspeita que fosse usada pela Rússia como uma espécie de “espião”, em missões de reconhecimento, já que o arnês que trazia parecia ser feito para transportar uma pequena câmara de vídeo.
Mas não é nesse sentido que aponta a investigação feita por este documentário, cuja realizadora se chama Jennifer Shaw. Citada pelo The Guardian, a documentarista afirma que “as últimas revelações sobre o papel para o qual o Hvaldimir foi treinado colocam-nos mais perto de resolver o mistério”. Mas essas revelações, diz a realizadora, “também levam a novas questões sobre as intenções que a Rússia tem para estar a guardar o Ártico, e porque estará a fazê-lo”.
O documentário chama-se “Os Segredos da Baleia Espiã” e passou 10 meses a investigar o caso e a procurar contributos de quem tem experiência no treino de mamíferos marinhos para fins militares. Foi entrevistado Blair Irvine, um treinador de golfinhos norte-americano que hoje tem mais de 80 anos de idade e é uma das últimas pessoas vivas entre as que estiveram envolvidas num programa da Marinha dos EUA que usou golfinhos como animais de guarda na costa californiana.
Pela mesma altura, há quase 50 anos, acredita-se que a União Soviética também teve programas de treino de golfinhos e foi apurado, na Guerra Fria, que havia um grupo de golfinhos a patrulhar o Mar Negro na zona da Crimeia (território ucraniano que foi anexado pela Rússia em 2014). O documentário entrevistou, também, Eve Jourdain, uma bióloga especialista em baleias que comentou que “era óbvio que esta beluga, em particular, tinha sido treinada para pôr o nariz em qualquer coisa que parecesse ser um alvo”.
Tudo indica que golfinhos foram usados pela União Soviética para encontrar armamento submarino na década de 1980, ao abrigo de um programa que terá terminado no fim na década de 90. Em 2017, porém, o Ministério da Defesa russo admitiu que o país tinha voltado a usar animais marinhos para fins militares em zonas polares.
“Sabíamos que queríamos descobrir mais sobre a verdadeira identidade da baleia – é um mistério que tem cativado pessoas em todo o mundo”, disse a documentarista Jennifer Shaw”, acrescentando: “também nos deu a oportunidade de explorar a história do treino de mamíferos marinhos nas forças armadas – algo de que poucas pessoas têm conhecimento, uma vez que esteve mergulhado em segredo durante décadas e muitos daqueles que sabiam a verdade, infelizmente, já não estão vivos”.
A beluga macho foi encontrada morta na baía de Risavika, no sul da Noruega há poucas semanas. O corpo do animal foi encontrado por um homem e o filho que estavam a pescar. O animal teria cerca de 15 anos, o que não é muito numa espécie cuja esperança de vida pode chegar aos 60 anos. A ONG Marine Mind acredita que Hvaldimir tinha chegado à Noruega vindo de águas russas, onde terá estado em cativeiro – uma tese que ganhou força porque a beluga parecia estar acostumada à presença humana.
Inicialmente foi noticiado que a beluga não tinha quaisquer ferimentos externos visíveis mas, dias mais tarde, uma responsável da organização não-governamental One Whale, que disse ter visto o corpo de Hvaldimir, disse que a baleia “tinha vários ferimentos de bala à volta do corpo”. Já o dirigente de outra ONG, a Noah, afirmou que “os ferimentos na baleia são alarmantes e de uma natureza que não pode descartar um ato criminoso”.
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