• Dom. Dez 15th, 2024

Feijoada Politica

Notícias

Nasceu de uma inspiração, cresceu para ser o Starbucks do pão e agora está à venda. O que vale a Padaria Portuguesa? – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Dez 14, 2024

Não revelando ao certo o que pretendem com a venda ou o que farão no futuro, os donos da Padaria Portuguesa viram chegar-lhes um dividendo de 800 mil euros (registado como pagamento em 2023). Isto depois de em 2020 e 2021 a empresa ter registado prejuízos, por “culpa” da pandemia que até levou Nuno Carvalho, em 2020, a ameaçar fechar.

“Desde o dia 13 de Março que o nosso negócio teve quebras de 50% e, desde que foi decretado o estado de emergência, as quebras são superiores a 60%. Se por um lado estes números são positivos por representarem uma manifesta adesão da população à necessária quarentena, por outro lado, numa perspetiva empresarial, são números verdadeiramente desastrosos e que põem em causa a viabilidade do negócio e comprometem, já no curto prazo, a resposta aos compromissos com os colaboradores, com os fornecedores e até com o próprio Estado. Sendo este o caso na A Padaria Portuguesa, uma empresa com uma gestão profissional e já com uma escala considerável, imagino que seja talvez pior para um conjunto alargado de players do setor por todo o país”. Na carta enviada a Pedro Siza Vieira, então ministro da Economia, Nuno Carvalho pedia que o Estado injetasse “capital fresco de imediato nas empresas” e confiasse “nos empresários que têm acrescentado valor ao país e sempre têm sido responsáveis nos seus compromissos e obrigações”. Pedia mudanças nos instrumentos que tinham sido disponibilizados — como o layoff simplificado, as linhas de crédito, carências de pagamentos — sob pena, “caso contrário, empresas como a A Padaria Portuguesa perdem a viabilidade e irão fechar portas em poucas semanas”.

Padaria Portuguesa diz que medidas do Governo “são ineficazes e de forma alguma oferecem soluções para os problemas”

Assumia, nessa missiva, que a empresa tinha sido, desde a fundação, “financeiramente saudável e sempre honrou a tempo e horas os seus compromissos e, felizmente, vive uma realidade favorável em matéria de tesouraria (tesouraria invertida). Contudo, por ser uma empresa de mão de obra intensiva e devido à pesadíssima carga fiscal existente em Portugal, é um negócio de margens baixas”.

De facto, se o volume de negócios foi de 42,6 milhões de euros em 2023, o EBITDA (resultado antes de depreciações, gastos de financiamento e impostos) ficou nos 3,34 milhões de euros. Em 2023 manteve lucros, de 1,63 milhões de euros, beneficiando de um crédito fiscal de quase 800 mil euros. O resultado antes de impostos foi de 836 mil euros, o que compara com os 966 mil euros em 2022 (ano em que teve lucros de 886 mil euros).

Nos dois anos anteriores, o resultado foi negativo, o que determinou uma interrupção dos lucros que em 2019 atingiram 1,32 milhões de euros, para um EBITDA de 4 milhões de euros. Nesse ano, a empresa registou, nos pagamentos e recebimentos, um dividendo de 755 mil euros a sair da companhia. Um pagamento que só voltou em 2023.

A margem EBITDA, que afere a rentabilidade operacional de um negócio, passou de 10,2% em 2019 para 7,8% em 2023. Uma empresa como a Ibersol que opera na restauração, mas que tem mais insígnias e segmentos variados (sendo a responsável pelo lançamento da concorrente Pret a Manger), está com margens EBITDA de dois dígitos. A Starbucks teve, em 2023, uma margem operacional de 16,3%.

Não são conhecidos os números que estão a ser pedidos para a venda desta operação, mas fontes financeiras sugerem ao Observador que, neste setor, há negócios a acontecer por cinco ou seis vezes o EBITDA, o que daria um valor de 16,5 milhões ou quase 20 milhões de euros. No entanto, é preciso avaliar se o comprador quer também adquirir a entrada num novo mercado e aí pode estar subjacente um prémio em cima dos múltiplos de EBITDA transacionados.

Não surpreendem essas fontes que se possa, no limite, chegar ao múltiplo de 10 vezes o EBITDA, ou seja 30 milhões de euros. Se for um comprador já com presença em Portugal dificilmente os múltiplos chegam aí.

Há ainda a ter em conta que em cima destes múltiplos há uma dívida de cerca de seis milhões, que tem de se descontar ao valor final do negócio.

Não há negócios recentes a nível internacional cujos valores envolvidos sejam conhecidos. Aconteceram algumas operações que visaram a entrada de insígnias europeias nos Estados Unidos da América na indústria de padaria, mas que não implicaram lojas. O atrativo mercado dos Estados Unidos também chegou a estar no radar da Padaria Portuguesa. Nuno Carvalho chegou a confidenciar ao Expresso o seu sonho americano e que passava por abrir lojas em cidades como Nova Iorque, Washington e Boston. Em 2019 — antes da pandemia — assumia estar a “estudar a abertura de lojas próprias com um parceiro local que tenha conhecimentos do negócio, mais do que capacidade financeira. Temos vindo a olhar para vários países e gostamos do mercado americano, por ter escala, ser uma economia que funciona bem e um desafio para qualquer gestor se internacionalizar”. Não havia data. E continua sem existir negócio internacional no portefólio da Padaria Portuguesa.

Depois de terminado o curso no ISEG, Nuno Carvalho entrou na Jerónimo Martins. Chegou a diretor. “Tinha uma carreira ótima, trabalhava num grupo excelente, adorava o negócio e sentia-me ultraidentificado com os valores da empresa”, mas “senti-me muito pequeno”. Foi ao ouvir Alexandre Soares dos Santos que diz que o levou a reposicionar o posicionamento na sua vida, porque queria dar algo à sociedade. “A determinada altura achei que tinha reunido competências para acrescentar valor ao país e montar o meu próprio negócio, no sentido de deixar legado”, diz, assumindo não ter nascido “com a missão de desenvolver o negócio próprio. Nunca me chateou trabalhar para terceiros, sobretudo tive uma experiência profissional riquíssima, no grupo Jerónimo Martins”, onde trabalhou dez anos.

Depois do momento de introspeção, tomou a decisão de montar o negócio e pensou e discutiu várias ideias e áreas de negócio. “Um dia vai aparecer uma ideia engraçada”. Um dia a ideia foi a Padaria Portuguesa. Havia uma pastelaria em cada esquina, um local onde se bebe café, comem pastéis de nata e as pessoas se encontram. Um local de experiências sociais que tem como veículo os pães, os bolos e o café. O conceito foi estruturado em mais de um ano.

Em março de 2010 os registos comerciais notaram a constituição de uma nova sociedade. RSCQ – Atividades Hoteleiras. Tinha um capital social de 25 mil euros e como sócios Vasco Ferreira Metelo de Carvalho (irmão de Nuno), ZDQ (de José Diogo Quintela) e Nuno Rebelo de Sousa, filho de Marcelo Rebelo de Sousa. Em agosto desse ano já era Nuno Carvalho que aparecia como gerente dessa sociedade. A primeira loja da Padaria Portuguesa abriu portas em novembro desse ano. Pouco tempo depois Nuno Rebelo de Sousa deixou de constar como sócio e surgiu uma empresa denominada Bakers Capital como um terço do capital, tendo subscrito um aumento de capital nesse momento. A Bakers Capital tinha sido criada em novembro desse ano e tinha dois sócios: a Onec e a DL pertença, respetivamente, de Fátima Alvarez Madeira, da África do Sul, e Manuel Dias Loureiro, ex-ministro da Administração Interna e que esteve ligado ao BPN, tendo a sua investigação sido arquivada. A Bakers Capital foi dissolvida em 2014, mas já tinha há uns anos saído do capital da Padaria Portuguesa.

Por que razão Dias Loureiro não foi acusado no caso BPN?

Foi no momento em que a Bakers Capital entrou, com aumento de capital, que a RSCQ mudou a designação para Padaria Portuguesa. E em 2012 a companhia já com essa designação inscrevia, nos registos, como sócios: Nuno Carvalho, ZDQ, e mais três elementos da família. Hoje são sete os sócios todos do núcleo familiar. O capital social de 37.500 euros mantém-se, ainda que haja outros instrumentos de capitais próprios que atingem 462 mil euros.

Nuno Rebelo de Sousa — que está no centro do caso das gémeas que está a ser escrutinado no Parlamento em comissão de inquérito — teve uma presença passageira por esta empresa, mesmo antes de algumas das polémicas que a envolveram. Já sem o filho de Marcelo no capital, o Presidente não passou ao lado da expansão da Padaria Portuguesa. A 12 de maio de 2016, poucos meses depois da eleição e da tomada de posse, Marcelo Rebelo de Sousa aparecia na 40.ª loja da empresa, no Príncipe Real, antes da inauguração oficial. “Uma inesperada visita matinal”, declarava a Padaria Portuguesa no seu Instagram.





Source link

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *