Portugal pára pela primeira vez para discutir o assunto. O aborto e a condição da mulher. Foi o passo necessário ao primeiro referendo. “Mas [ainda hoje] não está tudo resolvido”, diz, referindo-se também a um eventual alargamento da despenalização até às 12 semanas de gestação, um regime que vigora largamente na Europa, e ao qual o país ainda não deu resposta, depois de só ter despenalizado a IVG em 2007.
Não admira, talvez, quando o país se desenvolve, diz-nos, debaixo de um culto patriarcal que parece não ter fim, nem quando é abertamente denunciado e ridicularizado como Monique Rutler o fez, em 1983, com Jogo de Mão, quatro histórias reveladoras do machismo português sempre capazes de envergonhadamente chegar ao momento atual. “Abanar a sociedade e abrir mentalidades” era o mínimo que ela podia fazer ainda no rescaldo de uma euforia coletiva em que o novo ia chegar, custasse o que custasse.
Mas não, o que chegou foi a dificuldade em filmar, o pedinchar por cada tostão para realizar os projetos, as salas cada vez mais escassas para exibir filmes, a distribuição a desaparecer, as equipas a desfazerem-se, outros caminhos a percorrer, no encalce da educação de que o país continuava a precisar, e essa ideia desassombrada de que isto ia mudar. Monique Rutler foi em frente e bateu o pé para fazer coisas como Os Direitos das Crianças (para a RTP, em 1979); Repensar a Escola – Perspetivas da Escola Primária em Portugal (para a Direção-Geral do Ensino Básico, em 1979); Ciência e Técnica Hoje e Amanhã (para a RTP, entre 1979 e 1980); Viagem através do Homem (para a RTP, em 1982); Assoa o Nariz e Porta-te Bem! (para a RTP, em 1980) A-da-Beja (em 1984).