Vasco Martins é amigo de Pedro Carvalho desde sempre, desde quando eram meninos no bairro de Sacavém, iam juntos para a escola, mais tarde para a discoteca. Vasco, que até tem um irmão de sangue, admite que tem com Pedro uma relação mais próxima, de profunda fraternidade. Habituou-se a vê-lo sem nunca lhe encontrar qualquer diferença, mesmo quando numa semana “perdeu todo o cabelo”, uma das consequências da doença. Eram adolescentes, nessa altura. “Eu sei que foi complicado para ele, do ponto de vista da imagem, da autoestima. Mas o Pedro tem uma personalidade muito forte e nunca se deixou abater por isso. Sempre conseguiu resistir e ir-se impondo à sua maneira, nos vários grupos de amigos que ele tinha, de forma que o aceitaram sempre bem. E sabe o que é curioso? Nunca lhe ouvi um queixume, apesar de já ter passado por tanto”.
Eram homens adultos quando os problemas de saúde de Pedro se agravaram. Nessa altura, Vasco já tinha a sua própria família (a mulher, e um filho, agora com 20 anos). O amigo passou a ser ainda mais presente. Pesquisou sobre a doença, falou com o amigo-médico. “Acho mesmo que ele estar vivo, ainda hoje, não é um milagre, mas deve-se muito à ciência. E à resiliência que tem”, afirma Vasco. Com o tempo, e depois de Pedro deixar de trabalhar — “o momento mais duro para ele, porque adorava o que fazia” — passou a estar ainda mais atento, tornando-se mais presente. Quando o amigo vendeu a casa, no Montijo, e comprou outra, em Sacavém (onde cresceu, com os pais, e se sente verdadeiramente em casa) e foi preciso agilizar a mudança, lá estava Vasco a tratar de tudo.
“Ligo-lhe praticamente todos os dias. Até para perceber se mantém as rotinas, se já almoçou, essas coisas básicas”, sublinha. Bem vistas as coisas, “é como um irmão. Ele não é como se fosse da família: é da minha família. De tal forma que nos últimos anos passa o Natal connosco. Nem podia ser de outra forma”, conclui Vasco, que mora na Bobadela, e por isso “num saltinho estou ao pé dele, se for preciso. Eu estou preparado para isso”, conclui.
Está ainda fresco na memória de ambos o último 11 de setembro, dia em que Pedro fez 50 anos. “Eu liguei-lhe umas semanas antes para organizarmos um convívio com os amigos. Como ele não quis fazer nada, acabámos a almoçar: eu, ele e a minha mulher”. E ainda hoje falam sempre daquele momento, quando Pedro fez 27 anos. “Estávamos os dois ao telefone, eu a dar-lhe os parabéns, quando um avião chocou com as Torres Gémeas. Isso nunca se esquece”. Vasco, essa espécie de sombra que nunca deixa o amigo sozinho, recusa a ideia de ser quem mais dá, nesta amizade.
“Ele dá-me muito, sabe? Dá-me uma das coisas mais importantes, que é relativizar as nossas coisinhas. Às vezes estou com um problema qualquer e ligo-lhe. E ele conta-me que acabou de ter uma arritmia, por exemplo. Eu calo-me logo. Porque ao pé dos problemas dele, o meu será zero.”