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O que nos resta depois de dançarmos com Cindy Lee? – Observador Feijoada

ByEdgar Guerreiro

Mai 16, 2024

Podia ser a banda-sonora de um filme de David Lynch, a música que se ouve num cabaret com sofás em veludo vermelho e uma bola de espelhos a refratar a luz escassa, aquela canção que se apanhou numa estação pirata ao atravessar a Califórnia de carro descapotável no final dos anos 60, ou mesmo um êxito obscuro a saltar de uma jukebox num café em Queens na década de 70, mas é tudo isto em simultâneo, como uma matrioska musical, que em vez de sucessivas bonecas revela todos os rostos do rock’n’roll clássico, aqui Roy Orbison, ali 13th Floor Elevators, com (possível) cameo de Charles Manson.

Ou então, podia ser a maior homenagem a todas as variações possíveis e imaginárias da música de guitarras feita ali por altura de meio do século passado, quando a adolescência aderiu ao então nascente rock’n’roll. Mas são apenas duas horas de música de guitarra retro, música que não se limita a imitar o passado, antes remonta cada peça do guarda-fatos até que o cabide se torna utensílio de cozinha – não sabemos muito bem o que fazer com ele mas é impossível não o admirar.

E se editar 30 canções que ocupam mais de duas horas e se vestem do rock dos anos 60 para assaltar a nossa imaginação e nos transportar para um mundo que já não existe, nunca existiu, ainda mais estranho é que o disco não exista no Spotify – aliás, que só tenha presença no Youtube. Isto – seja lá esta maluqueira o que for – é Diamond Jubilee e Diamond Jubilee é para aí o sétimo disco de Cindy Lee que, por sua vez, é o projeto musical e drag de Patrick Flegel, antigo guitarrista e vocalista dos (das?) Women. Patrick usa como pronome “They”, uma opção que não é de fácil tradução no português corrente, que tem sempre género. Lidar com esta situação implica evitar os artigos definidos e os pronomes possessivos.

[o álbum “Diamond Jubilee”, disponível na íntegra no Youtube:]

Não fazemos ideia o que terá levado Patrick a achar uma excelente ideia criar toda esta música, que contém doo-wop (Wild one), disco-sound (em Olive drab, estranho disco-sound, mas ainda assim disco-sound e com uma bela linha de baixo), rock psicadélico (Flesh and blood) ou a canção que faltava a Twin Peaks (a espantosa Baby blue), sabemos apenas que: tinha razão, foi de facto uma excelente ideia.

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Mas tudo nesta história parece ser complicado – ou até na história que antecede esta: os (as?) Women acabaram depois de supostamente a banda toda desatar à porrada entre si no final de um concerto; algum tempo depois, em fevereiro de 2012, um dos membros, o guitarrista Christopher Reimer, morreu durante o sono; durante algum tempo não se soube nada sobre a sua morte, mas mais tarde a editora Flemish Eye afirmou ter-se tratado de um problema cardíaco (como, em princípio, todas as mortes).

Os (as) Women eram canadianos (possivelmente canadianos com pouca vontade de que se soubesse muito a seu respeito, tendo em conta a escassez de informação), o que nos faz crer que Patrick será do Canadá, embora em entrevistas – não há muitas, mas há algumas – dadas nos últimos anos afirme viver na Carolina do Norte – mas seria incorreto responsabilizar a pobre carolina do Norte pela louca biblioteca aleatória de derivados do rock dos 60s e 70s que é Diamond Jubilee – se pensarmos bem, Women, US Girls e Dirty Beaches tinham todos um som rock retro e eram todas bandas canadianas – de Toronto, mais especificamente. Estou a culpar-te por isto, Toronto.



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