Um clima político tão polarizado pode funcionar como um terreno fértil para atentados deste género. Mais: a Eslováquia atravessava uma verdadeira maratona eleitoral, que causava ainda mais polarização. Em setembro do ano passado, houve eleições parlamentares que levaram à formação de um governo liderado por Robert Fico; há mês e meio, eleições presidenciais deram a vitória a Peter Pellegrini, aliado do primeiro-ministro; e, no início de junho, há eleições europeias.
Além disso, como conta o Politico, as divisões sociais na Eslováquia são muitas — novos contra velhos, população urbana contra rural e saudosistas do regime comunista contra pró-ocidentais. E já vêm desde a independência do país e da separação da Checoslováquia, em 1991.
Por exemplo, Robert Fico juntou-se ao Partido Comunista da Checoslováquia. Quando a União Soviética colapsou e o país adotou um caminho pró-ocidente, o jovem de 25 anos continuou a acreditar nos ideais daqueles tempos, confessando-se como um saudosista do comunismo. Como refere o Politico, o atual primeiro-ministro sabia que isso era uma ideia que não era popular entre a generalidade da população e que poderia liquidar o seu futuro político; de forma pragmática, decidiu assim formar um partido próximo do centro-esquerda, o Smer-SD, no qual se mantém até hoje.
“Robo, anda cá.” Terão sido estas palavras que o poeta Juraj Cintula pronunciou antes de disparar pelo menos cinco vezes contra Robert Fico. O homem de 71 anos, natural da cidade de Levice, será fundador de um clube literário na cidade de Handlova e escreveu três coletâneas de poesia. É, desde 2015, membro da Associação Eslovaca de Escritores.
‼️ Video of the first interrogation of the man who shot Fico 5 times
The writer Juraj Cintula, who shot #Slovak Prime Minister #Fico, said he did it because he disagreed with the government’s policies. pic.twitter.com/DDPBLnyxFj
— NEXTA (@nexta_tv) May 15, 2024
Havendo investigações ainda em curso, sabe-se já que Juraj Cintula estava incomodado, como confessou num vídeo partilhado nas redes sociais, com o encerramento do canal estatal, um tema que começou esta quarta-feira a ser discutido no Parlamento da Eslováquia. Robert Fico deseja fundar uma nova televisão do Estado, sendo que os opositores temem que este seja um meio para que o Estado controle o fluxo de informação — colocando em risco a liberdade de expressão.
Para além disso, Juraj Cintula indignava-se com o estado da Justiça na Eslováquia. “Por que razão Mazák foi retirado do seu cargo?”, questionou o atirador. Segundo o jornal eslovaco Spectator, Ján Mazák foi destituído do cargo de presidente do Conselho Judicial da Eslováquia em abril por indicação do governo. O responsável jurídico ligou a sua destituição ao facto de ter liderado uma investigação sobre corrupção que envolvia o próprio Robert Fico e membros do governo, como o ministro da Defesa.
Ainda sobre Juraj Cintula, de acordo com a Euronews, há publicações no Facebook de 2016 que mostram que era um simpatizante de um grupo paramilitar eslovaco pró-russo, chamado Slovenskí Branci. Esta milícia foi acusada de tentar recrutar jovens eslovacos, mas não é claro o envolvimento atual do atirador contra o primeiro-ministro eslovaco.