As casas não são coletivas e não são habitação social. São propriedades privadas, estão espalhadas por várias zonas de Lisboa e são arrendadas no mercado livre — esse tem sido, aliás, o maior problema, devido à especulação imobiliária. “O grande objetivo é resolver a situação de quem está na rua e garantir que essas pessoas mantêm as casas e não voltam para essa situação. E quando a habitação se resolve, o resto melhora. No fundo, não é uma questão cultural, é uma questão de direitos humanos.”
Andreia Caires, coordenadora da equipa Casas Primeiro, formada em Desenvolvimento Comunitário e Saúde Mental e especialista em Psicologia Comunitária, fala de uma intervenção feita à medida, de um trabalho concertado e exclusivo para quem sai da rua, sofre com doença mental, e volta a ter uma casa. “Fazemos uma análise detalhada de toda a situação, fazemos um plano individual de intervenção, articulamos com a unidade de saúde familiar e outras instituições.” No fundo, a AEIPS tenta trabalhar num modelo colaborativo, não duplicando nem replicando respostas sociais (como as garantidas pela Segurança Social, serviços sociais da câmara, Instituto de Emprego e Formação Profissional ou Santa Casa da Misericórdia de Lisboa) e desenvolve um plano para cada inquilino, que é moldado ao longo do tempo.
Dário Teixeira é outro inquilino do Casas Primeiro. Viveu 24 anos na rua, dormia em tendas, casas abandonadas, carros sem dono. Não tinha poiso fixo, pernoitava onde calhava sob o céu de Lisboa e ainda andou uns tempos por Faro. Chegou a acordar num rés-do-chão devoluto com as janelas que, de um dia para o outro, foram fechadas a tijolos e cimento sem ele dar conta. Lembra-se bem. “Bati com a cara num muro de tijolos e tive de saltar do primeiro andar para sair.” Foi noutra vida. Outra vida diferente da que tem agora.
Há nove anos que mora no bairro da Madragoa, em Lisboa. Casa no rés-do-chão, bicicleta encostada a uma mesa, um peixe de plástico gigante e uma bandeira de Portugal fixados na parede. Cama feita, livros em cima da estante, guitarra a um canto, vários CD, um frigorífico. Ao fundo, a cozinha e uma casa de banho. Foi uma assistente social da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa que lhe falou do projeto. “Ter um teto faz muita diferença, posso ter os meus projetos, posso lavar a roupa, posso andar limpinho.”