O vice-presidente da bancada do PSD, Cristóvão Norte, espera que o PS acabe por viabilizar a descida de um ponto do IRC para evitar que a AD seja obrigada a avaliar “as opções”, sem afastar por completo a viabilização da descida proposta pelo Chega (de dois pontos). Em entrevista à Vichyssoise, da Rádio Observador, o também presidente da distrital do PSD/Algarve diz que, mesmo sem descida do IRC, a AD deve aprovar o seu orçamento, mas avisa que isso é um desvirtuar da vontade popular.
Relativamente às autárquicas admite que o voto útil vai prevalecer e permitir que a subida do Chega não seja suficiente para que PSD perca câmaras para o PS. Sobre potenciais candidatos Presidenciais, Cristóvão Norte diz que é preciso esperar pelos candidatos, mas elogia a bitola ética de Luís Marques Mendes e diz que Passos Coelho é o seu “herói”.
[Ouça aqui na íntegra o programa Vichyssoise desta semana:]
Sermão da AD, queixas de Ventura e OE aprovado
Teme que o orçamento seja desvirtuado agora na especialidade?
Creio que não havia outra solução. Os portugueses reconhecem que o Governo tem iniciativa, que é um governo fresco e que procura abordar os problemas. Contrasta com um governo já mais esgotado, nos últimos dois anos, de maioria absoluta. Os portugueses sabiam que a circunstância de se abrir uma crise política com o orçamento conduziria, provavelmente, a eleições legislativas, que não acelerariam o processo político e que trariam uma indesejável instabilidade, com custos muito perversos para o país. Os portugueses sabem também que ao Governo cumpre a obrigação de dialogar de modo a viabilizar o seu programa; à oposição corresponde também a obrigação de não tentar, unilateralmente, impor o seu programa a esse governo, desvirtuando [o OE] e abrindo, dessa forma, se não for por outra via, uma crise política.
Vamos imaginar que o IRC não desce em virtude dessas aritméticas entre o PS e o Chega, assim como outras medidas. Isso seria suficiente para, no fim, as bancadas do governo poderem chumbar o próprio orçamento?
O esforço que o governo fez é inspirado no interesse nacional. O governo abdicou de aspetos que têm relevo, designadamente esse do IRC. O PS, não obstante não ter chegado a acordo, assumiu que se absteria no Orçamento. Ora, o que extraio de uma declaração dessa natureza é uma obrigação do PS em assegurar que o esforço que foi feito pelo Governo no sentido de se aproximar das propostas do PS é salvaguardado com a abstenção. Entender isso de outra forma poderia conduzir a que essa abstenção do PS se verificasse na especialidade completamente inútil, porque conduziria, com a composição de outras maiorias, à aprovação de outras propostas que corromperiam a lógica de acordo. Por uma questão de estabilidade e de responsabilidade, não vejo que tal se colocasse em cima da mesa. Mas creio que há uma obrigação indeclinável por parte das demais forças políticas e em particular do PS em garantir que o processo da especialidade não corre de uma forma a prejudicar um esforço significativo, que está no limite, para garantir a aprovação.
Mas se o PS votar contra a proposta de IRS que está no Orçamento do Estado, e o Chega já disse que vai propor a descida de dois pontos percentuais, o PSD deveria aprová-la?
Ainda não pensei sobre essa aritmética em concreto e sobre o que é que resultará daí. Agora, do meu ponto de vista, seria muitíssimo indesejável que fosse impedida de vigorar qualquer proposta do PSD no sentido da redução do IRC. Fosse a proposta originária, nos termos em que o PS a rejeitou liminarmente, fosse a proposta revista que o PS considerou que era uma aproximação razoável, mas que significava que não se comprometeria para outras circunstâncias. A partir do momento que nós dizemos que nos abstemos naquela proposta do Orçamento do Estado, significa que aquela proposta tem de ir até ao fim. Se não for, já não é mesmo a proposta. Ora, se o PS impedir que essa proposta vá até ao fim, o PSD tem de apreciar as suas opções para tentar realizar os seus objetivos políticos, a menos que aceite indiscriminadamente ficar refém o Partido Socialista.
O chumbo da proposta do IRC é suficiente para isso?
Não sei, ainda não discutimos isso, nem quero especular demasiado sobre isso. Agora, se há um compromisso num determinado sentido, para ser realizado tem de se garantir que o essencial desse compromisso chega a ser votado. Se for destruído na especialidade, então o que é que sobra? O que verifico é que haverá a intenção do PSD de dar cumprimento àquilo que submeteu à apreciação do PS. Mas isso pode, eventualmente, conduzir a que o PS tenha que tomar uma posição em relação à matéria que garante a sua viabilização, sob pena de estar a empurrar o PSD para outras coisas…
Que outras coisas? Desistir desta versão do orçamento?
Não, não, não.
Mas disse que o PSD tinha de olhar para as suas opções. Quais é que seriam as suas opções, nesse caso?
O PSD entende que a questão do IRC é uma questão fundamental. Já esteve disponível para abdicar da redução. Mas não desejamos, em circunstância alguma, que do processo de especialidade e votação final global do orçamento de Estado não resulte nenhuma descida do IRC. Isso é evidente para todos os portugueses.
Mas qual é a consequência disso?
O PS sabe que o PSD fez já essa proposta. E já perante essa proposta, o PS assinalou que se viabilizaria o Orçamento. Ora, isso tem como consequência o PS permitir que essa proposta vá até ao fim, porque essa proposta faz parte do pacote orçamental que o PS disse que garantia. Isto é de bom senso e não creio que vá haver problemas.
Portanto, acha que deve ser o PS, na especialidade, deve acabar por aprovar a descida do IRC? Mas não é essa a intenção do partido.
Não sei qual é a solução concreta. Agora, sejamos do partido de que formos, olhando para a lógica das coisas e a forma como elas foram conduzidas, isto é indiscutível.
Há outra questão que está em cima da mesa para a especialidade, que é a do aumento de pensões. Luís Marques Mendes, ainda no domingo, dizia que podia haver margem para acomodar essa matéria. Não sei se acredita que, se não houver, está a desenhar-se aqui uma possível coligação negativa.
Não creio que as forças políticas estejam privadas de apresentar propostas na especialidade. Isso é o processo orçamental comum. E, portanto, quem sou eu para castigar as opções políticas de quem quer que seja por apresentar as suas propostas? Agora, nós conhecemos a composição do Parlamento. Os portugueses querem que o Governo, governe. Que a Assembleia da República, fiscalize; que a oposição faça oposição. Portanto, uma coisa são mudanças com significado marginal, coisa diferente são coligações negativas com o propósito inconfessável de prejudicar a ação do Governo.
Mas o aumento de pensões já seria uma dessas propostas?
Não sei. Tenho que ver a proposta em concreto. Essa proposta, do meu ponto de vista, até é uma proposta daquilo que eu conheço, das declarações que foram proferidas pelo Luís Marques Mendes a respeito do assunto, que é uma coisa que não é o fulcro, não é o alfa e o ómega. Há ali um conjunto de pessoas que entendem que devem ter esse direito e que, porventura, não sei se não lhes terão sido criadas algumas expectativas a esse respeito. Portanto, é uma questão a ser dirimida com base nas margens que o Governo tem e aí, devo dizer, quem está em melhor condições para fazer essa avaliação, para averiguar em que medida é que os compromissos internacionais respeitantes às questões do défice e outras estão ou não cumpridas, obviamente é o Governo. Não tenho o domínio fino de cada um desses números para poder exprimir uma opinião consolidada a respeito da matéria.
A principal crítica que tem sido feita a este Orçamento do Estado é que podia ter sido apresentado por António Costa e Fernando Medina. O próprio Governo já reconheceu que este é o Orçamento possível. Admite que o documento assim desiluda alguns eleitores da AD?
O documento é uma manifestação do sentido de compromisso do Governo. Portanto, a AD não teve maioria absoluta. Tem 78 deputados, não tem 116 e tem que conduzir as coisas de uma maneira. Primeiro, a aprovação deste Orçamento do Estado deve-se, em primeira linha, aos portugueses. Foram os portugueses, como aliás há uma sondagem recentemente de que o Governo deve continuar, que compeliram outras forças políticas a assumirem posições que viabilizam o Orçamento do Estado. Repare-se, por exemplo, no que foram as declarações do Pedro Nuno Santos há sete meses, dizia que era praticamente impossível ou qualquer coisa assim. Portanto, isso mudou. Acho que isso mudou, mas o vento mudou. E o vento são os portugueses que têm uma opinião sobre o Governo. Obviamente que nós não podemos obrigar as demais forças políticas a de repente converterem-se a uma ideia de reforma do país como nós entendemos.